quinta-feira, 30 de abril de 2020

Aprender a Fazer

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 16

Não nos referimos, porém,  à educação moral pelos livros e sim à que consiste na arte de formar os caracteres, à que incute hábitos, porquanto a educação é o conjunto dos hábitos adquiridos.

Os rumos educacionais do século XXI apontam o ato de "saber fazer" como um dos quatro pilares do processo de desenvolvimento dos potenciais humanos. Extremamente coerente com a evolução, este "aprender a fazer" leva-nos a ricas inferências para o modelo espírita da educação.

A informação espírita é cultura, e a cultura em si não abriga o saber, porque o saber implica o uso da informação para gerar a transformação - meta essencial da proposta espírita.

Conciliando as assertivas educacionais da modernidade, percebemos, através de avaliações sinceras, que nossas agremiações doutrinárias cumprem com a valorosa missão do esclarecimento, apontando as diretrizes do que se "deve fazer", contudo, ficam evidentes as necessidades prementes sobre o "como fazer". Indicar roteiros nem sempre será garantia de melhoria, porque cada individualidade traz em sua bagagem maior ou menor facilidade de compreensão das Verdades Cósmicas. Por essa razão o estudo minucioso do "saber como fazer" inclui a interação do aprendiz com os veiculadores do conhecimento em tarefas grupais, participativas, dialogais, com plena troca de informações na construção do saber.

Podemos deixar algumas questões, entre diversas, que nos compete formular, a fim de aquilatar a extensão do quanto temos que aprender acerca do "como fazer". São elas:

Como aprender a dialogar? Como amar a si mesmo? Qual a fórmula para efetivar o perdão verdadeiro? Qual o remédio para o melindre? Existe uma forma de controle da irritação? Como vencer os conflitos sexuais? Como amar inimigos? Como superar os impulsos mentais de violência? Como dominar as desordens nos raciocínios, quando nos encontramos sob pressão? Como discordar e criticar sem gostar menos? Qual o caminho para formar uma equipe harmoniosa? Qual a forma prática para sermos bons parceiros dos bons espíritos? Como penetrar nos labirintos do personalismo em nossa intimidade? Como fazer o autoconhecimento?

O momento das vivências espíritas conclama uma tomada de posição nova. A ênfase dada à instrução precisa ser seguida de uma pedagogia mais palpável que permita aos estudantes espíritas a melhor absorção vivencial dos conhecimentos. Levemos o ensino da casa espírita para “fora de si mesma” em atos e decisões que comprovem sua efetiva adequação ao entendimento; somente dessa forma estaremos trabalhando pela construção do saber em nós mesmos. A isso denominamos contextualização - aplicação prática e o desenvolvimento de habilidades a partir dos conteúdos espíritas adquiridos nas abençoadas tarefas do estudo.

Nesse prisma, a convivência ganha conotações de caráter disciplinar e motivador a inestimáveis lições no cadinho do autoburilamento espiritual.

O "saber fazer" implica um compromisso de grandes proporções, concitando-nos a mudanças de profundidade.

O centro espírita quando escola do espírito apresenta, na sua operosidade, elementos estimuladores a esse imperativo de solidificar em grupo os alicerces individuais do saber que cada qual dará conta na sua faina renovadora, contextualizando-o na intimidade.

Em auxílio a esse assunto, enumeremos quatro referências que merecem reciclagem e aperfeiçoamento na criação de ambientes educativos, que melhor permitam aos partícipes um eloquente encontro consigo mesmo, que, sem dúvida, é o ponto de partida para deflagrar o "aprender a fazer".

- A Transmissão do Conteúdo - não é mais importante acumular informação, mas saber pensar, saber organizar o trabalho, saber gerenciar o conhecimento. Contextualizar é aprender a estabelecer uma relação de parceria com o conhecimento espírita, a fim de transformá-lo em instrumento do crescimento pessoal. A forma tradicional de transmitir conteúdos, centrados em programas e divulgadores do ensino doutrinário, reduz a capacidade comunicativa, que deve ser uma via de mão dupla, e incentiva a adoção de dogmas na informação doutrinária, sob o influxo de velhos atavismos da alma.

- A Pedagogia do Afeto - é a didática da relação dialógica, relação parceira, interativa, pois na vida social a relação nunca é monologal. A massificação é fator dispersivo, daí o valor dos grupos. Quando esse conhecimento é passado como conteúdo - informação pronta - o educando deixa de ter a oportunidade de dar a ele os seus significados, seus sentidos, e então o saber perde o colorido da representação individual capaz de contextualizar as vivências gerando a "Ética do ser." Ter conhecimento é diferente de "ser" o conhecimento.

- Os Projetos Vivenciais - além de gestor do conhecimento, o centro espírita deve ser um laboratório de encontros humanos, com projetos de estudo e oficinas para esferas específicas de necessidades, mentalidade educativa centrada em valores pelo desenvolvimento de competências, dinâmicas de expressão e criatividade nos campos da vida interpessoal.

- Os Relacionamentos Educativos - os projetos não podem ser artificiais. Sua eficácia é comprovada no próprio círculo onde se efetiva, através de relações de afeto que são tecidas entre os convivas, base segura e produtiva para grupos que buscam contextualização. Os valores do respeito e da solidariedade mútua garantem a expressão dos significados pessoais e a valorização de todas as atividades.

quarta-feira, 22 de abril de 2020

Carências

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 15

“Mediante a organização que nos deu, não traçou a Natureza o limite das nossas necessidades?

“Sem dúvida, mas o homem é insaciável. Por meio da organização que lhe deu, a Natureza lhe traçou o limite das necessidades; porém, os vícios lhe alteraram a constituição e lhe criaram necessidades que não são reais.”

O Livro dos Espíritos – Questão 716

Carência é o estado íntimo de insatisfação que surge da privação de alguma necessidade pessoal, cujo principal reflexo é o sentimento de infelicidade.

Sob análise espiritual, é um fluxo energético de vibrações não compensadas reclamando o dinamismo da complementação para gerar bem-estar e equilíbrio na vida do ser. Uma força centrípeta que não ultrapassa a psicosfera individual em razão de constituir uma “atração para dentro”, um apelo para o suprimento de algo necessário à auto-realização.

Na ótica afetiva, é um processo de desnutrição que pode ter-se iniciado na infância ou até mesmo em outras reencarnações. Advém de desejos recalcados, expectativas não colimadas, frustrações não superadas; uma descompensação emocional pelas experiências traumáticas mal elaboradas, gerando episódios de conflitos e sofrimentos no automatismo da vida mental.

A maior carência humana é de afeto e carinho, sem os quais ninguém se sente humanizado. E não se sentir humano significa permitir a influência dos reflexos primitivos que açulam a ganância e a crueldade proveniente do instinto de conservação exacerbado. No estágio espiritual da Terra, a carência do afeto, quase sem exceções, está subordinada aos ditames da lei de retorno.

Nem tanto do amor alheio precisam os carentes, porque a carência não está somente nessa ausência de ser amado. Existem "mecanismos bloqueadores" compostos por processos emocionais e psíquicos dos espírito, o qual se sente sob rigorosa "prisão nos sentimentos", que são ativados, automaticamente, no campo mental em razão dos despenhadeiros de ilimitados crimes do coração que se arrojou em existências anteriores, agravados pela educação infantil em regime de aridez afetiva. Tais mecanismos levam a não se sentir amado, mesmo que o seja...

Outra razão evidente das origens da carência pode ser encontrada na ausência de preparo para lidar com as perdas. Na Terra não se prepara a criança para lidar com perdas. A educação é quase toda destinada a fazer "campeões sociais", vitoriosos em tudo. Pais frustrados tentam se realizar no sucesso de seus filhos, exigindo deles o que não conquistaram, tentando consertar erros e fracassos através da criação de um "super-herói" dentro de casa. Sob pressão e coação do sucesso, muitos espíritos de psiquismo frágil e que aspiram outros ideais sucumbem, em comportamentos desajustados no vício ou no desequilíbrio dos costumes, como forma de encontrar alguma gratificação e prazer, já que suas habilidades inatas, aquelas que trazem como espírito imortal, são desconhecidas e desconsideradas pelo seu grupo educativo. Crianças muito mimadas ou compensadas excessivamente para cumprirem os seus deveres querem tudo que desejarem na vida adulta, inclusive o afeto alheio, e para isso mascaram-se de mil modos no jogo das aparências como se estivessem em uma disputa da qual jamais admitem sair perdedores.

Outras carências surgem como ilusões da vida moderna estimuladas pela mídia e pelos costumes, exigindo verdadeiros imperativos de reeducação e controle para não levarem a padecimentos desnecessários, voluntários.

As matrizes profundas da carência podem ser encontradas no subconsciente. É o vício milenar de exigir e esperar ser amado sem disposição altruísta suficiente para amar. Resulta de uma construção lente e gradual com bases no egoísmo.

Solidão, ciúme, dependência, escassa auto-estima, complexo de inferioridade, insegurança, fantasias, atrações "proibidas", impulsos mentais permissivos, ambivalência sexual, depressões, patologias corporais e outros tantos quadros de sofrimento podem decorrer dessa tormentosa vivência da "prisão emocional" - reflexos fidedignos das atitudes inconsequentes e levianas de outrora. E nos bastidores de todas essas tormentas está o "espírito carente" atestando sua incapacidade de amar, exigindo atenção e cristalizando-se no apego ou alimentando o ciúme, em conflituosas crises de possessividade.

O carente, em verdade, é um doente que deseja ardentemente amar sem conseguir. Não conseguindo, passa a exigir ser amado, criando relações complicadas e frágeis; é alguém à míngua de amor, um constante cultivador da esperança de ser compensado. Sua experiência, porém, frequentemente revela facetas ignoradas de si próprio.

A carência surge quando desconectamos o mundo dos sentimentos daquilo que realmente preenche e gratifica, priorizando o falso conceito de realização estipulado pela sociedade. A convivência vai moldando na mente alguns modelos de vida e, porque se torna um caminho comum da maioria, mesmo que não atenda a nossos mais íntimos pendores e aspirações, deixamo-nos levar por essa influência, negando o que sentimos e fazendo o que os outros pensam que devemos fazer, ou ainda aquilo que pensamos que devemos fazer.

A alma carente é alguém em débito perante sua própria consciência. Essa realidade da subjetividade humana é percebida na intimidade através de sentimentos de baixa estima, vergonha, incapacidade, autopiedade, que levam o ser a se estiolar nos complexos de culpa de múltiplas variações.

Nada na criação foi gerado com carências e tudo foi criado para “pulsar para fora”. Porém, nossa incúria e teimosia, nossa infidelidade e rebeldia aos códigos Divinos ensejaram os caminhos da escassez. Carência em termos do espírito não é somente aquilo que falta, mas o resultado em forma de desajuste comprado a preço de irresponsabilidade.

Todos temos o que precisamos e merecemos na vida, e se não concordamos com esse alvitre da Lei Divina cabe-nos, a todo instante, o direito de tentar melhorar nosso “existir” trabalhando pela melhoria que aspiramos. E somente nesse afã de lutar pelo que idealizamos, no limite de nossas forças, é que saberemos o que nos reserva a vida no rol das experiências de cada dia, eliminando assim algumas carências que dependem do nosso esforço na caminhada de aperfeiçoamento. Para triunfar nesse mister, somente amando e servindo.

Observa-se que boa parcela das pessoas não está aceitando mais, em nenhuma hipótese, a possibilidade de fazer cada conquista a seu tempo. Querem tudo para já, custe o que custar. A grande maioria dos espíritos reencarnados na atualidade tem vivido a “filosofia do imediatismo". As necessidades e anseios pessoais não obedecem à prova da resistência moral pela paciência e perseverança. E no atendimento de suas metas, percorrem os caminhos largos da precipitação e da imprudência, buscando em forma egoísta o gozo, o prazer, a satisfação de suas fantasias. Depois surgem a decepção e a mágoa, e somente então percebem a fragilidade de suas escolhas.

Nesses torvelinhos de dor, não tendo força e coragem o bastante para assumir a sua responsabilidade, projeta culpa a outrem se eximindo de admitir também as suas decisões infelizes que contribuíram em suas dificuldades. Mais adiante, passadas as crises mais intensas dos resultados de suas más opções, perceberá sua necessidade afetiva ainda mais acrescida de novos apelos e convites para outras tentativas de fruir o máximo, fazendo o mínimo. Essa tem sido a roda da vida" de muitas criaturas no transcurso de suas desditosas experiências no corpo físico.

O controle da vida emocional é o primeiro passo no suprimento das nossas necessidades reais. Saber adiar a gratificação pessoal é muito importante na aquisição desse controle. Tudo a seu tempo, conforme os méritos e esforços pessoais.

Perseverança e coragem são duas nobres virtudes que precisam ser cultivadas nesse caminhar da existência, a fim de colocarmos em funcionamento a possibilidade de alcançarmos nossas metas. Todavia, destaquemos que tais virtudes serão improfícuas se o nosso estado emocional for de inconformação, porque criará uma barreira vibratória de obstrução no suprimento das nossas carências variadas. O estado espiritual de inconformação ou azedume com o que nos cerca retira expressivas funções calmantes e compensadoras no campo mental, nascidas dessas nobres virtudes.

Nosso destino é a felicidade e a completude sem carências. Hoje as sentimos em razão da trajetória pela qual optamos, colhendo da vida aquilo que nela plantamos. Leis perfeitas regem nosso merecimento e somente quando empenharmos pelo amor, perceberemos que carência é o outro nome de egoísmo.

Estejamos certos de que a melhor solução para nossos problemas de equilíbrio, nas necessidades e aspirações pessoais, será sempre manter-se firme nos ideais enobrecedores que vertem da proposta terapêutica do amor. Quem ama, ainda que precisando ser amado, supre-se, eleva-se, compensa-se. De forma alguma estamos fazendo apologia ao descuido conosco no campo das expectativas íntimas e do desejo de ser amado, entretanto, tenhamos lucidez para compreendermos que a postura de cobradores revoltados e a atitude de precipitação não nos levarão a lograr os ideais de ventura e realização sonhados, agravando ainda mais as nossas provas.

Obviamente, as mais elementares necessidades humanas serão sempre, de alguma forma, atendidas. Entretanto, nossa condição de penúria espiritual leva-nos a refletir na colocação feita pelos sábios Instrutores da Verdade ao afirmarem: “Por meio da organização que lhe deu, a Natureza lhe traçou o limite das necessidades; porém, os vícios lhe alteraram a constituição e lhe criaram necessidades que não são reais.”

Num mundo faminto de amor, a Terra tornou-se o local onde a maioria espera saciar sua fome afetiva e poucos são os que optam pela Divina escolha de amar. Não fosse o celeiro de Amor da Misericórdia e certamente a humanidade, por si mesmo, já teria se dizimado, tamanho o barbarismo emocional que não distancia muito o homem hodierno de certas espécies irracionais, nos campos da violência e da indiferença.

Colaboremos com o Pai. Amemos intensa e nobremente. Rica expressão do Amor Divino, a vida nos recompensará com farta nutrição que jamais nos deixará sentir a falta do essencial para sermos felizes.

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Velho Descuido

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 14

“Os que no Espiritismo vêem mais do que fatos; compreendem-lhe a parte filosófica; admiram a moral daí decorrente, mas não a praticam. Insignificante ou nula é a influência que lhes exerce nos caracteres. Em nada alteram seus hábitos e não se privariam de um só gozo que fosse. O avarento continua a sê-lo, o orgulhoso se conserva cheio de si, o invejoso e o cioso sempre hostis. Consideram a caridade cristã apenas uma bela máxima. São os espíritos imperfeitos.”

O Livro dos Médiuns – Capítulo 3 – Item 28

Quando mencionamos ser importante estudar e aprimorar o campo da conduta nas lições da casa espírita, é porque nas relações diuturnas do centro encontramos os embriões da postura moral do futuro. É a escola do espírito na qual treinamos os hábitos da regeneração. Apesar disso, a inexperiência e a imaturidade costumam criar um nível muito elevado de expectativas relativamente à conduta que deveria caracterizar o trabalhador espírita, gerando grave problema de relacionamento na maioria dos grupos doutrinários.

Espera-se, com certa dose de razão, daqueles que esposam os princípios espíritas, que sejam criaturas de hábitos sublimados e comportamento exemplar, e quando se constata que nem sempre os amigos de ideal são o que idealiza-se que fossem, abre-se espaço para as cobranças, o desencanto e a desafeição.

Entretanto, recordemos que, se a expectativa é um direito que nos cabe em relação ao próximo, jamais devemos esquecer que o dever convida-nos à tolerância quando não somos correspondidos naquilo que esperamos, a fim de não nos permitir tombar nas ciladas da decepção e da mágoa, da exclusão e da indiferença.

A desafeição acalentada – velha armadilha da convivência – entre companheiros de ideal costuma levar ao desencanto com a Doutrina, perda de motivação com a tarefa e afastamento temporário em direção à desistência.

Muitos corações incipientes nesse assunto da vida moral costumam julgar o proceder alheio como hipocrisia, sendo que nem sempre os atos de infidelidade aos princípios evangélicos significa falsidade, mas sim a dificuldade natural  de superar imperfeições, sobre as quais ainda não adquirimos completo domínio e transformação.

Ser espírita, no entendimento de muitos, ainda é um conceito bastante exterior e superficial. Concebe-se, muitas vezes, que ser espírita é ter condutas padronizadas e aceitas como um modelo pela comunidade doutrinária. Tais critérios levam a definir o espírita dentro da diretriz moral "espírita faz isso e não faz aquilo", estabelecendo normas muito frágeis no campo da aparências para serem quesitos de validação da genuína conduta espiritista. Outras vezes, adota-se critérios vinculados à "folha de serviço" estipulando que a habilidade com as práticas doutrinárias é atestado de superioridade e competência cristã, conferindo ao "tempo de casa" e "quantidade de realizações" as referências de autoridade. Não podemos negar que todos esses parâmetros, quando avaliados sensatamente, são qualidades condizentes com o que venha a ser espírita, no entanto, é necessário que sejam acompanhadas das conquistas interiores, sendo fundamental associar essas referências aos valores cristãos que estamos consolidando nos sentimentos e ações de cada dia. Além disso, somente as podemos aferir com precisão em nós mesmos.

Anotemos alguns pontos de meditação que nos auxiliarão a compreender melhor as causas de nossos incômodos com o comportamento alheio nessas vivências que discriminamos:

- A "recordação" de sentimentos semelhantes já experimentados em vidas pretéritas nas quais adotamos intencionalmente a mentira.

- O assédio de espíritos que desenvolveram a sagacidade em detectar ou mesmo induzir a faixa mental das decepções nos relacionamentos, levando suas "vítimas" a decisões infelizes. São os cultores desencarnados da mágoa. Existem milhões deles na psicosfera terrena.

- Os encontros noturnos com amigos do coração que nos advertem para a vigilância em nossas ações, porém, na vigília física, relembramos mais facilmente essas orientações ao vermos o outro fazendo aquilo para o qual fomos alertados que não deveríamos fazer.

Ambientes onde escasseia a fraternidade prolifera a falsidade e o desânimo. As pessoas sentem-se agredidas com cobranças sutis ou diretas, o que as leva a mentir para continuar fruindo das benesses das tarefas ou passar a nutrir profunda desafeição, que as arrefece nos ideais de melhora.

Poucos de nós conhecemos a intimidade do nosso próximo que partilha as responsabilidades do aprendizado e do trabalho na casa espírita, portanto, procuremos sempre os cuidados com o estímulo e a caridade que devemos uns aos outros, nessa escola abençoada na qual buscamos a força e a orientação, para vencermos os grandes obstáculos íntimos.

Compaixão e tolerância nas relações sempre deverá ser o nosso lema. Se o ambiente das equipes ensejar bons exemplos, aqueles que por agora ainda não testemunham tanta fidelidade ao que já sabem, imitarão os mesmos ou naturalmente se excluirão da equipe por entenderem que ainda não estão convictos do ideal que abraçaram. Ao invés de expectativas e “promissórias de perfeição” ao outro, enderecemos-lhe a nossa firmeza e coerência contagiantes.

Decepção e ressentimento em grupos espíritas são mantidos somente por aqueles que ainda não descobriram o valor do perdão incondicional ou por se manterem, excessivamente, apegados a pessoas e grupos, nutrindo elevada cota de expectativas, em franca postura de egoísmo, de bem-estar exclusivamente pessoal. Tais corações acalentam sonhos de “lugares paradisíacos e angelicais” sem medir a extensão dos limites e resistências de seu semelhante, esquecendo-se que o centro espírita é um hospital para doentes graves da alma que desejam sua recuperação e melhora espiritual.

Velho descuido da convivência humana: buscar corrigir as pessoas para que se encaixem em nossos modelos de expectativas e transformar as diferenças do outro em defeitos. Traços típicos dos espíritas imperfeitosconforme classifica com muita propriedade o senhor Allan Kardec. Traços que deixam claro que estamos muito mais ocupados em cultivar severidade para com a melhora dos outros e desatentos da mais importante e única tarefa na qual verdadeiramente temos irrestrita capacidade de realizar: a nossa melhora pessoal.

Carregar o peso de esperanças assentadas em direitos que supomos possuir sobre o próximo é trabalhar pela nossa infelicidade. Concedamos a todos o direito de serem o que são, aceitando-os incondicionalmente como prova de amor e autêntica superioridade espiritual. Dessa forma, perceberemos de pronto que estaremos fazendo enorme bem a nós mesmos, na preservação da paz, e evitando agastamentos perfeitamente desnecessários.

quinta-feira, 9 de abril de 2020

Personalismo, a Lupa do Orgulho

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 13


"O egoísmo assenta na importância da personalidade. Ora, o Espiritismo, bem compreendido, repito, mostra as coisas de tão alto que o sentimento da personalidade desaparece, de certo modo, diante da imensidade. Destruindo essa importância, ou, pelo menos, reduzindo-a às suas legítimas proporções, ele necessariamente combate o egoísmo."

O Livro dos Espíritos - Questão 917


O personalismo é o grande adversário da causa do amor.

Consideremo-lo em uma metáfora como a lupa do orgulho voltada na direção do eu, ampliando, exageradamente, o valor pessoal. Um estado no qual a mente está mais voltada para os apelos do ego em negação aos ditames da consciência.

O fio condutor de seus nocivos reflexos é a paixão pela importância individual que supomos possuir.

Sua ação desorganiza o departamento mental da imaginação e projeta na vida as imagens de si mesmo pelas quais nasce o "império do eu", encarcerando-nos no automatismo do egoísmo.

Não vivemos imunes ao personalismo. Ele constrói psiquicamente a identidade pessoal e a participação no meio onde vivemos; o problema é o excesso da importância que conferimos ao eu, perdendo o controle tornando-se um vício, o vício do "amor" próprio.

Ver o mundo pela ótica individual é uma necessidade para aquisição de valor pessoal, contudo, o apego intransigente às próprias concepções, sem abertura para permuta e ampliação da experiências individuais, é que torna uma questão grave de conduta nas relações junto aos grupos de convivência.


Por milênios estamos vivendo essa experiência. Hoje, sob as alvíssaras da renovação íntima, assumiu proporções de um grande desafio a ser superado em favor da causa espírita que abraçamos.

Assevera-se que o serviço em equipe é garantia de sua erradicação, e não podemos discordar, embora tenhamos que assinalar que mesmo nessa circunstância a sanha do personalismo poderá arrasar as melhores sementeiras espirituais, caso não vigiemos suas formas ardilosas de manifestar.

Alguns exercícios poderão auxiliar-nos na sua identificação, o que será o primeiro passo para um programa reeducativo. Eis uma pequena lista:

- Emitir opiniões sem fixar-se obstinadamente na ideia de serem as melhores.

- Aprender a discernir os limites entre convicção e irredutibilidade nos pontos de vista.

- Ouvir a discordância alheia acerca de nossas ações sem sentimento de perda ou melindre.

- Cultivar abnegação na apresentação dos projetos nascidos no esforço pessoal, expondo-os para análise grupal.

- Evitar difundir a “folha de serviço” das realizações pessoais já concretizadas.

- Disciplinar e enobrecer o hábito de fazer comparações.

- Acreditar que a colaboração pessoal sempre poderá ser aperfeiçoada.

- Pedir desculpas quando errar.

- Ter metas sem agigantá-las na sua importância frente às incertezas do futuro.

- Aprender a ouvir opiniões para melhor discernir. 

- Admitir para si os sentimentos de mágoa e inveja.

- Ser simples.

- Ter como única expectativa nas participações individuais o desejo de aprender e ser útil.

- Esforçar-se para sair do “personalismo silencioso”, o isolacionismo e a timidez.

- Delegar tarefas, mesmo que acredite que outro não dará conta de fazê-la tão bem quanto nós.

Como vemos é aprendizado de longa duração que devemos começar com intensa humildade e contínua disposição de autoconhecimento.

Como diz o Codificador: "Ora, o Espiritismo, bem compreendido, repito, mostra as coisas de tão alto que o sentimento da personalidade desaparece, de certo modo, diante da imensidade". Concluímos então que se ainda nos aferramos com tanta desídia ao personalismo é porque ainda não compreendemos bem a nossa Doutrina, preferindo acreditar nas concepções individualistas ao sabor de opiniões pessoais...


quinta-feira, 2 de abril de 2020

Interiorização

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 12

“Fazei o que eu fazia, quando vivi na terra: ao fim do dia, interrogava a minha consciência, passava revista ao que fizera e perguntava a mim mesmo se não faltara a algum dever, se ninguém tivera motivo para de mim se queixar. Foi assim que cheguei a me conhecer e a ver o que em mim precisava de reforma.”

O Livro dos Espíritos – Questão 919

Imaginemos que um excelente engenheiro fora convidado por uma empresa para fazer uma reforma na parte interna de suas dependências. Seria viável chamá-lo à porta de semelhante edificação e solicitar-lhe imediatamente um planejamento da tarefa, sem que ele conheça os mínimos detalhes que a compõem?

Essa comparação pode ser trazida para a vida íntima. Que reformas poderemos efetivar em nós, sem o devido conhecimento do que precisa ser transformado?

Conhecer-se é a primeira iniciativa a fim de estabelecermos um acordo de paz interior. É a via de acesso para chegarmos ao estágio íntimo do bom relacionamento com a sombra, a tal ponto de nos munirmos de condições para uma autêntica mudança.

Conhecer-se é libertar-se da ignorância, adquirir domínio e poder perante si mesmo.

Essa viagem ao mundo íntimo exige preparo e exercício, sem os quais poderá ser infrutífera e repleta de motivos para o desânimo.

Santo Agostinho oferece-nos um roteiro de viagem seguro e eficaz: um balanço diário com a assistência de Deus e o “anjo da guarda”. A formula é simples, mas essencial.

Multiplicar as perguntas sobre o objetivo de nossos procedimentos é meditar; e quanto "material" oferece-nos a vida interpessoal para esse mister?!

O estudo de si mesmo vai exigir duas posturas que asseguram melhores resultados. Enumeremo-las:

Atenção Plena - é a arte Budista de observar-se incansavelmente, olhar-se sempre. É um hábito que deve ser desenvolvido na rotina, a fim de que o balanço noturno tenha elementos ricos para a auto-análise.

Para pessoas encharcadas de materialismo e preconceitos, o outro só tem valor na justa medida de seus interesses pessoais; as relações, nesse caso, são superficiais, perigosas, instáveis... As deficiências são atribuídas exclusivamente ao próximo, sem a suficiente disposição para uma incursão reflexiva nas próprias atitudes. São corações que vivem sob o império do narcisismo, escravos de crenças e modelos mentais de comportamento, educados para encontrar fora de si as causas para tudo que lhes acontece, anulando, quase que por completo, a possibilidade do auto-encontro, sempre aptos a analisar a conduta alheia.

A atenção plena do Budismo só é possível em criaturas que se dispõem a melhorar, que anseiam por permanente sentimento de renovação de si próprias.

A disposição de melhora, portanto, é-lhe a base de dinamização. Essa disposição alberga a ausência de punições, a dissolvência da culpa, a ternura consigo e os julgamento flexíveis e versáteis. Sem isso, esse auto-encontro pode tornar-se um caminho para a decepção e a insatisfação pessoal.

Interiorização - dispor-se a melhorar não basta para o auto-conhecimento. O próximo passo é a interiorização, o ato de enfrentar seu mundo interior, admitir para si a natureza de seus sentimentos, estudar as reações perante a vida; um trabalho muitas vezes doloroso e que poucos desejam realizar, vivendo em constante fuga de si mesmo.

Nessa tarefa de crescimento inclui-se a arte de ouvir a consciência, aprender a escutar os ditames Divinos.

A consciência é nosso elo de ligação com a Verdade; aprendermos a lidar com sua "voz" é aprender a ouvir Deus em nós.

Essa interiorização é a "degustação mental" daquilo que a atenção plena nos permitiu perceber.

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Na medida em que vamos descobrindo o desconhecido mundo de nós mesmos, vamos ganhando autonomia, paz, felicidade, porque passamos a encetar a caminhada consciente da evolução, senhores do eu, capacitando-nos para a liberdade responsável em todas as direções do existir.

Ter melhores noções de si enseja-nos uma convivência mais harmoniosa, pródiga de habilidades para a concórdia, a lealdade, o desapego, o perdão, a cordialidade, o afeto, tornando-nos pólos vigorosos de simpatia e bem-estar que serão fortes atrativos, pela força do exemplo, para que os outros se esforcem por imitar-nos o procedimento.

Se aquele engenheiro que citamos tiver o ensejo de esquadrinhar com precisão a edificação na qual irá trabalhar, seu planejamento de ação será mais produtivo, garantido e seguro para todos.

Da mesma forma, esse balanço interior, quando bem concretizado, será fonte de excelentes resultados no auto-aperfeiçoamento.

Atenção plena é vigília.

Interiorização é investigação permanente de si próprio.