sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Kardec e a Educação Integral

Livro: LAÇOS DE AFETO
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

PRIMEIRA PARTE
A Pedagogia do Afeto na Educação do Espírito

Capítulo 4

“Para agradar a Deus e assegurar a sua posição futura, bastará que o homem não pratique o mal?

“Não; cumpre-lhe fazer o bem no limite de suas forças, porquanto responderá por todo mal que haja resultado de não haver praticado o bem.”

O Livro dos Espíritos — Questão 642

Conhecida parábola da cultura oriental fala de uma senhora que resolveu abrigar um sábio guru no quintal de sua residência. Deu-lhe comida, abrigo e tranquilidade para que o homem de meditações pudesse cumprir sua missão.

Certa feita, desconfiada sobre a integridade do guru, resolveu aplicar-lhe uma prova. Contratou a preço de cinco moedas de ouro uma belíssima vendedora de ilusões e bailarina para aferir a resistência do homem santo. 

Na noite aprazada lá estava ela na cabana, tentando incendiar os apetites inferiores do guru com a sensualidade e a beleza. Bailou, despiu-se, provocou, mas o homem era de “gelo”, mantinha-se impassível, quieto, em estado de plenitude. Então, depois de longo tempo ela desistiu e retornou até a senhora dizendo:

- Tentei de tudo e nada, ele é um homem santo.

Intrigada, a hospedeira do guru indaga:

- Mas ele não lhe disse nada, não fez nada, uma só palavra?

- Não, senhora!

- Então toma tuas moedas, você fez sua parte.

Inusitadamente, a seguir ela tomou de uma larga vassoura e seguiu aos gritos em direção à cabana, assustando a vizinhança que conhecia o carinho com o qual tratava o meditador. Em lá chegando, espancou o homem, destruiu a cabana e em alta voz disse para que todos ouvissem:

- Testei esse homem com a luxúria, ele resistiu por três noites ao apelo de atraente e sedutora jovem, permaneceu em estado de orações, e quanto a isso eu o aplaudo. Porém, suas práticas são de nenhuma utilidade para o mundo, porque ele nada disse àquela jovem que pudesse servir de orientação e força na restauração de um caminho novo. Se é um homem de Deus, deveria agir pelo bem e não somente evitar o mal.

* * * * 

Evitar o mal necessariamente não edifica valores, enquanto fazer o bem significa acionar os recursos divinos latentes através do dinamismo da caridade.

Evitar o mal é contenção e disciplina, sendas formadoras de caráter, entretanto as realizações no bem sulcam a profundidade do sistema afetivo, fixando e dinamizando forças morais nobres.

Educação resume-se em transformar impulsos e desenvolver potencialidades. O ato de apenas conter sem renovar, pode levar aos mais sofridos caminhos da radicalização, do fanatismo e de variadas expressões neuróticas em direção a mais intensas desarmonias da psique.

O ato educativo é um ato de Amor nas relações que destinem ao crescimento para “ser”.

O processo de evitar o mal é adquirido com o domínio ocasionado pela disciplina dos sentidos e dos impulsos, enquanto a dinamização do bem exige da razão e do sentimento o desenvolvimento de condições interiores que edifiquem valores, treinem habilidades e façam surgir com maior plenitude as tendências inatas do bem que se encontram latentes e, quase sempre, “estáticas” na alma. Dessa forma, quando os Espíritos dizem: “Fazer maior soma de bem do que de mal constitui a melhor expiação" (1), é porque quase tudo conspira contrariamente para aquele que deseja melhorar, as reações são-lhe fortes reflexos do mundo interior desconhecido de si mesmo.

Diríamos que educar é encontrar respostas para os enigmas do existir, razão pela qual somente amando o outro e a nós mesmos conseguimos encontrar tais tesouros da vida.

Chamamos de integral o ato educativo com Amor, seja na prática pedagógica ou na vida de relação social.

A ausência de valores ético-morais dignificadores em nossas vidas sucessivas permitiram as perdas, as paixões, as crises, os traumas, os bloqueios e as traições, ferindo as fibras sensíveis da estrutura afetiva do perispírito, tendo como reflexos a culpa, o medo, a ansiedade, a frustração, a tristeza, o conflito, a insegurança e a indiferença quais fossem “nódulos e abcessos emocionais” que se apresentam em múltipla conotação psicopatológica, conforme o caráter de seus portadores, determinando o temperamento e a conduta. Agravados pela educação infantil da existência presente, tais “nódulos e abcessos” são inflamados e começam a purgar incontinentemente.

Diagnosticando esse dinamismo patológico, passa-se então à etapa do desenvolvimento das habilidades emocionais, capazes de promover novos e mais saudáveis sentimentos que libertem o ser dessa precariedade do afeto, quais sejam a coragem, a segurança, o autoamor, a serenidade, a alegria e a paz. A conquista dessas habilidades surge na busca pela autoeducação, regida pelas diretrizes evangélico-doutrinárias como excelente terapia curativa dessas “pústulas do sentimento”.

A educação do afeto inicia-se pelo estudo perseverante de si no conhecimento dessas manifestações sombrias do coração, suas raízes, suas armadilhas, suas máscaras. Posteriormente enseja uma nova forma de viver e “ser” pelo treino da empatia, da alteridade, da assertividade, da autenticidade.

O objetivo maior da vinda do homem à Terra é a sua melhora espiritual. Tal mister só será plenificado na medida em que aprender a amar, porque o Amor é o decreto sublime do universo para o crescimento e a felicidade de todos os seres.

Verificamos o centro espírita e sua importância como educandário do Amor face à didática estimuladora de conhecimentos e da vivência através da ampliação do saber e de transformação do caráter. As organizações humanas, com poucas exceções, fazem uma leitura adulterada das manifestações afetivas, tornando-as desprezíveis e com conotações de interesses inferiores e falsidade. Outras vezes, algumas pessoas mais afetuosas, quando possuem uma visão egocêntrica, recuam e tolhem a espontaneidade do carinho face aos desapontamentos das relações ingratas e decepcionantes. Assim, formam-se estigmas sociais acalentados pela maioria, sufocando as expressões de sensibilidade humana nas torres frias da indiferença e do desamor, para os quais a grande maioria dos homens foram “educados” no aprendizado de esconder o que se passa nos recônditos escaninhos do afeto.

Quanto nos valerá a reencarnação tendo os raciocínios iluminados pelos princípios estruturais da doutrina sem, contudo, jorrar essa luminosidade sobre o coração?

A fraternidade, expressando a síntese das virtudes cristãs, é a meta ética de todo o corpo filosófico e científico do Espiritismo. Eis, portanto, que tarefa grave aguarda nossas vanguardas doutrinárias no cenário conturbado da sociedade materialista dos dias atuais, junto às almas que ingressam para suas fileiras em ambos os planos existenciais.

1. O Livro dos Espíritos, questão 770 A

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Pestalozzi e a Educação do Coração

Livro: LAÇOS DE AFETO
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

PRIMEIRA PARTE
A Pedagogia do Afeto na Educação do Espírito

Capítulo 3

Pestalozzi definiu a educação como sendo o desenvolvimento harmônico de todas as potencialidades do ser, considerando como elementos latentes básicos no interior da criatura humana a inteligência, o sentimento e a vontade. Para ele, essa tríade, sintetizada em educar a cabeça, o coração e as mãos, ganhava uma amplitude incomensurável quando se cria a relação de Amor entre educador e educando.

Johann Heinrich Pestalozzi, sem dúvida, foi o educador do Amor. A ele devemos o mérito indiscutível de estabelecer as linhas afetivas da educação em maior proporção que outros pedagogos, demonstrando na sua própria vivência a eficácia de conduzir o processo educacional em elos de afeto.

Assinalamos em suas palavras na “Carta de Stans” (1) a grandeza de suas concepções, como segue:

“Minha meta principal direcionou-se, antes de mais nada, a tornar as crianças irmãs, cultivando os primeiros sentimentos da vida em comum e desenvolvendo suas primeiras faculdades nesse sentido. Com isso, minha intenção era fundir a casa no Espírito simples de uma grande comunidade familiar e, sobre a base de tal relacionamento e da predisposição por ele gerada, suscitar em todos um sentimento de justiça e moralidade.

Atingi meu objetivo com razoável sucesso. Em breve, viam-se setenta crianças mendigas, embrutecidas viverem juntas numa paz, num Amor, numa atenção recíproca e cordial que raramente se encontram entre irmãos de uma mesma família.

Minha ação, nessas circunstâncias, partia do seguinte princípio: procura em primeiro lugar fazer tuas crianças generosas. Pela satisfação diária de suas necessidades, impregnarás sua sensibilidade, sua experiência e sua ação de Amor e de caridade, que se estabelecerão e se consolidarão em seu íntimo. Depois, acostuma-as às práticas em que poderão exercitar e espalhar seguramente a benevolência em seu próprio círculo.”

A grande conquista da educação, segundo o mestre suíço, é a autonomia do homem pela maturidade de suas potências morais, que já se encontram em gérmen em seu mundo íntimo ao nascer.

As teorias modernas da psicologia têm demonstrado a importância essencial da emoção em todas as realizações humanas, confirmando por experiências e pesquisas sérias que o homem é dotado de múltiplas inteligências, sendo que suas habilidades emocionais são as mais aptas a fazer-lhe feliz e bem sucedido.

A visão “Pestaloziana” de educar, além de precursora, é perfeitamente compatível com a meta maior do Espiritismo, ou seja, o melhoramento moral da humanidade, a educação integral do homem bio-sócio-psíquico-espiritual.

Kardec, como aluno da escola de Yverdon, fundada por Pestalozzi, foi notadamente influenciado pela didática da tríade conhecida mais tarde como “Princípio do Equilíbrio de Potencialidades”, ou seja, mãos, corações e cabeça em harmonia. Nota-se em seu comentário na questão 917 de “O Livro dos Espíritos” o quanto essa cultura do emérito pensador suíço marcou sua formação quando diz: “A educação, convenientemente entendida, constitui a chave do progresso moral. Quando se conhecer a arte de manejar os caracteres, como se conhece a de manejar as inteligências, conseguir-se-á corrigi-los, do mesmo modo que se aprumam plantas novas. Essa arte, porém, exige muito tato, muita experiência e profunda observação”.

Esse desenvolvimento harmônico implica fazer crescer o intelecto, o afeto e a ação, não sendo demais afirmar que a coerência entre pensar, sentir e fazer respondem pelo equilíbrio do ser integral.

Temos desenvolvido a razão, mas, temos trabalhado o afeto? Temos disseminado conteúdos espíritas a mancheias, mas os temos contextualizado à vida?

Trabalhamos pela aquisição da fé racional, contudo, semelhante valor só será angariado na ética do “ser”, ou seja, na vivência das “Virtudes Paternas” ínsitas em nosso patrimônio sublime, prestes a descobrirmos pelas vias da evolução.


1. Trecho da “carta de Stans” na qual é narrada a experiência vivida por esse educador incomparável. Em Stans, ele cuidou sozinho de 80 crianças órfãs da guerra civil deflagrada pela revolução Helvética. “Educação e Ética - Pestalozzi” - Dora Incontri - Editora Scipione.

terça-feira, 24 de novembro de 2020

Aprender a Amar

Livro: LAÇOS DE AFETO
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

PRIMEIRA PARTE
A Pedagogia do Afeto na Educação do Espírito

Capítulo 2

Escutamos frequentemente frases que constituem atestados de incompatibilidade ou admiração instantânea em relacionamentos, emitidas rotineiramente nas diversas rodas de convivência, definindo alguns sentimentos que temos pelo outro como se fossem predestinados e definitivos.

Convivemos, comumente, “ao sabor” daquilo que sentimos espontaneamente por alguém.

Consideremos nesse tema que o Amor não é um automatismo do sentir no aprendizado das relações humanas, como se houvessem fatores predisponentes e inderrogáveis para gostar ou não gostar dessa ou daquela criatura.

Amar é uma aprendizagem. Conviver é uma construção.

Não existe Amor ou desamor à primeira vista, e sim simpatia ou antipatia. Amor não pode ser confundido com um sentimento ocasional e especialmente dirigido a alguém. Devemos entendê-lo como O Sentimento Divino que alcançamos a partir da conscientização de nossa condição de operários na obra universal, um “estado afetivo de plenitude”, incondicional, imparcial e crescente.

Ninguém ama só de sentir. Amor verdadeiro é vivido. O atestado de Amor verdadeiro é lavrado nas atitudes de cada dia. Sentir é o passo primeiro, mas se a seguir não vêm as ações transformadoras, então nosso Amor pode estar sendo confundido com fugazes momentos de felicidade interior, ou com os tenros embriões dos novos desejos no bem que começamos a acalentar recentemente.

O Amor é crescente no tempo e uniforme no íntimo, não tem hiatos.

Mesmo entre aqueles que a simpatia brota instantaneamente, Amor e convivência sadia serão obras do tempo no esforço diário do entendimento e do compartilhamento mútuo do desejo de manter essa simpatia do primeiro contato, amadurecendo-a com o progresso dos elos entre ambos.

Sabendo disso, evitemos frases definitivas que declarem desânimo ou precipitação em razão do que sentimos por alguém. Relações exigem cuidados para serem edificadas no Amor, e esse aprendizado exige os testes de aferição no transcorrer dos tempos.

Se nos guardamos na retaguarda moral e afetiva, esperando que os outros melhorem e se adaptem às nossas expectativas para com eles, a fim de permitirmo-nos amá-los, então, certamente, a noção de gostar que acalentamos é aquela na qual ainda acreditamos que Deus faculta isso como Dom Divino e natural em nossos corações conforme a sua Vontade.

Encontrando-nos nesse patamar de evolução, nada mais fazemos que transferir para o Pai a responsabilidade pessoal do testemunho sacrificial, na criação de elos de libertação junto a quantos esposam nossos caminhos nas refregas da vida.

Amor não é empréstimo Divino para o homem e sim aquisição de cada dia na aprendizagem intensiva de construir relacionamentos propiciadores de felicidade e paz.

Espíritas que somos temos bons motivos para crer na força do Amor, enquanto a falta de razões convincentes tem induzido multidões de distraídos aos precipícios da dor, porque palmilham em decidida queda para as furnas do desrespeito, da lascividade, da infidelidade, da vingança e da injustiça, em decrépitas formas de desamor.

A terapêutica do Amor é, sem dúvida, a melhor e mais profilática medicação do Pai para seus filhos na criação. Compete-nos, aos que nos encontramos à míngua de paz, experimentá-la em nossos dias, gerando fatos abundantes de Amor, vibrando em uníssono com as sábias determinações cósmicas estatuídas para a felicidade do ser na aquisição do glorioso e definitivo título de Filhos de Deus.

E se esse sentimento sublime carece aprendizagem, somente um recurso poderá promover semelhante conquista: a educação.

segunda-feira, 9 de novembro de 2020

A Pedagogia do “Ser”

Livro: Laços de Afeto
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

PRIMEIRA PARTE
A Pedagogia do Afeto na Educação do Espírito

Capítulo 1

Jesus, o Mestre.

Nós, os aprendizes.

A reencarnação, sublime matrícula no aprendizado.

A Terra, incomparável escola do Espírito.

O Amor, lição essencial.

O afeto, pedagogia do ‘ser”.

O centro espírita, excepcional núcleo educativo da alma.

Eis uma síntese a qual nos propomos desenvolver nessa Parte I, destacando as nossas agremiações doutrinárias como educandários, sem precedentes na sociedade, para o desenvolvimento da competência essencial do Amor.

O afeto é um dos pilares do desenvolvimento humano saudável. Uma habilidade que abre largas portas para a entrada do Amor, porque ser afetivo é laborar com o sentir. Diríamos assim que a afetividade é um degrau para o Amor. E amar é desenvolver-se para “ser”, verbo que traduz o existir Divino ou existir para a felicidade. “Ser” é educar-se, externar o amplo contingente de valores e potencialidades celestes que dormitam há milênios em nosso eu Divino, que nos conduzem ao destino glorioso de Filhos de Deus, à plenitude. Portanto, a pedagogia do “ser” tem no afeto um de seus principais potenciais didáticos.

Ninguém pode “ser” permanecendo agrilhoado aos trâmites expiatórios do “sentir mórbido”, ou seja, essa forma inferior de viver a vida do “homem fisiológico”, voltado somente para as sensações, o prazer, a competitividade selvagem.

Afeto é uma força da alma de incalculável poder. Sua boa utilização demanda sólida formação moral para que o vigor dos sentimentos seja abençoada estrada de libertação nos passos das atitudes.

Esse ‘existir humano” apela para valores nobres a fim de consagrar uma ética do “ser” em identidade com aquilo que de fato é “ser”. Verificamos assim o quanto é relevante o papel do centro espírita, associação que busca, essencialmente, burilar o caráter, a virtude, desenvolver o moral da criatura.

Sob os auspícios de uma casa doutrinária bem conduzida, o desafio do “existir humano” torna-se uma proposta atraente, motivadora, clara e simples.

Nesse tempo de materialismo e do império da razão, nossas casas de Amor devem fixar-se na função social reeducativa do sentimento, aprimorando-se cada vez mais para honrar o título de escola da alma, desenvolvendo pessoas felizes, realizadas, dignas e solidárias.

Aprender a amar é pois a competência essencial que deveria fundamentar quaisquer conteúdos de nossas escolas espirituais. Aprender a amar o próximo, aprender a amar a si, aprender a amar a Deus.

E como ensinar o Amor no centro espírita?

Fala-se muito no que devemos fazer, mas pouquíssimas vezes em como fazer. Como amar o outro, a si e a Deus contextualizando?

Contextualizar o conteúdo espírita abstraindo o excesso de informações e trazê-lo para a realidade de seu grupo, priorizar respostas, soluções, discutir vivências, refletir sobre horizontes novos de velhos temas do viver, reinventar a vivência em direção aos apelos da consciência, propiciar à criatura externar sonhos, limitações e valores já conquistados, fazendo da sala de estudos espíritas um laboratório de ideias na ampliação da capacidade de pensar com acerto, lógica e bom senso. Isso se chama educar.

A esse mister somos convocados para uma mudança de paradigmas urgente nas metodologias pedagógicas da casa espírita. Somos convocados a reestruturar essa visão “sacra”, que faz de muitas de nossas células templos de religiosismo, conduzindo seus profitentes a fórmulas de imediatismo e acomodação, ou à absorção do conhecimento espírita em lamentável dogmatismo, recheado de presunção com a verdade.

A pedagogia do “ser” inclui os valores da participação, da interatividade, da cooperação. Não temos outro caminho para arregimentar essas opções didáticas que não seja a formação de equipes, pequenos grupos de amigos voltados para o estudo e o trabalho, congregados em torno de ideais incentivadores da evolução de nossas potencialidades. Grupos que absorvam para a rotina das sociedades doutrinárias projetos de trabalho, ousando o inusitado, o incomum, implantando novas e mais ajustadas propostas de ensino e trabalho no atendimento das demandas humanas, e na consolidação de habilidades e valores que promovam o homem a uma vida mais íntegra, gratificante e libertadora, sob as luzes da imortalidade.

Grupos nos quais a imaginação, o desejo, os sonhos, os limites, as conquistas, as dores, a criatividade, as idiossincrasias, as dúvidas, as respostas, a experiência e, sobretudo, o afeto, possam fazer parte desse projeto de “ser”. Permitir à criatura apresentar-se como está e ensejá-la serviço e conhecimento - o antigo lápis e papel da educação - é matriculá-la na escola da vida sob a tutela dos princípios redentores do Evangelho e do Espiritismo, a fim de que ela, por si mesma, aprenda o caminho do Amor na transformação e no existir de cada instante, em busca de sua felicidade.

A pedagogia do “ser” prioriza o homem, sua experiência pessoal, o relacionamento humano, tendo como polo de atração o idealismo, que é o centro indutor dos valores morais e a defesa vigilante contra nossas intempéries, provenientes das bagagens vivenciais seculares.

Grupos que se amam e se querem bem, formando ambientes agradáveis para conviver, estabelecem as premissas para esse “ser”, e isso, inevitavelmente, além de felicitar a criatura com o que ela precisa para seu crescimento, também trará reflexos, acentuadamente benéficos, para as realizações doutrinárias graças à alegria e comprometimento com os quais o trabalhador fará sua adesão aos deveres na escola da alma, honrando os princípios espíritas-cristãos com uma vida reta, plena de sobriedade e identidade com a base social da fraternidade e da transformação para o bem, onde quer que esteja participando.

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

O Milênio de Jesus

Livro: Laços de Afeto
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Prefácio

“Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus.”

Jesus (Mateus 5:8)

Com essa obra homenageamos os dois mil anos do nascimento de Jesus comemorados hoje na Terra.

Celebramos a data relembrando o Amor - cerne das propostas educacionais do Mestre.

E a inspiração para nossas anotações buscamo-la no Seu discípulo da Era Nova, Allan Kardec, tomando por base o excelente tratado de vida interpessoal contido no capítulo 29 de O Livro dos Médiuns, “Das Reuniões e das Sociedades Espíritas”. A atualidade das questões enfocadas pelo Codificador sobre relacionamentos entre companheiros de ideal é roteiro consistente e seguro para a edificação da convivência harmoniosa.

Objetivamos, em “Laços de Afeto”, propor a meditação e o estudo conjunto a partir de fatos colhidos aqui e acolá, na faina doutrinária, destacando a importância da afetividade como degrau para autênticas relações de Amor e base para a criação de um clima espiritual ideal nas instituições fraternais do Espiritismo.

A afetividade é tema de profundos estudos e pesquisas científicas na humanidade, porém, objetivando conduzir os textos para o coração e a meditação, abstraímo-nos do rigor técnico que exigiria pesquisa intelectual dos conteúdos abordados, tarefa essa que vem sendo desenvolvida por competentes cooperadores, em ambos os planos de vida, com expressiva clareza e utilidade.

Alertamos os leitores, especialmente os espíritas, para evitarem conceber nossas abordagens como “manual prático de vida”, transformando os apontamentos em psicologismo ou regras de felicidade imediata. Chamamos a atenção para esse ponto por constatarmos uma tendência humana a “canonizar” ideias provenientes de intercâmbios mediúnicos, convertendo-as em caminhos coletivos da verdade ou normas de soluções fáceis ante os problemas da existência. Cada um deverá absorver nessa ou naquela consideração algo que contribua para seu crescimento, utilizando sempre a “relativização” do saber, do entendimento e da experiência.

Portanto, nada além fizemos que reunir temas sugestivos para o debate amigo e sincero entre equipes de serviço e estudo, priorizando ângulos que emergem como imperativos misteres nas agremiações bafejadas pela luz espírita. Pinçamos alguns itens de valor do capítulo 29 de O Livro dos Médiuns, e sugerimos o estudo minucioso desse texto da obra basilar, por acreditarmos que constituirá investimento incomparável para a instrumentalização das equipes espiritistas.

Educadores e outros especialistas maduros e cônscios de seus deveres sociais e espirituais poderão, no futuro, contribuir em muito para o desenvolvimento de nossas ideias, levando ao centro espírita os recursos diversos de sensibilização e aprimoramento relacional entre as criaturas, colaborando com o desenvolvimento da vida afetiva em suas nuanças através de técnicas que facilitem a compreensão das “leis e mecanismos do coração”. Programas educativos do afeto farão parte dos círculos de Amor do Espiritismo em tempo não muito longínquo...

Sociedades espíritas fraternas só serão construídas por homens e mulheres mais dóceis e cordiais, mais confiantes e afáveis, mais amigos e amáveis. A criação dessas novas relações é garantia de uma aprendizagem mais sólida e bem aproveitada em nossas casas espirituais, facultando melhor assimilação dos conteúdos doutrinários e sua consequente aplicação no desenvolvimento de habilidades morais e emocionais, tão escassas na convivência entre as criaturas perante a pressão das lutas da vida terrena. Teremos assim, mais afeto, melhor ambiente e bem-estar para conviver e maior motivação para servir e aprender!

Os resultados serão percebidos e sentidos na dilatação da criatividade para soluções dos problemas, na solidariedade aos projetos de Amor desenvolvidos por outros colaboradores, na superação das fronteiras institucionais, no suporte emocional às lutas individuais para alcançar as metas de melhoria interior e, sobretudo, na disposição com os deveres assumidos junto à comunidade que serão executados com mais comprometimento e cuidados nascidos na prestabilidade espontânea.

Assim, laços de confiança e fraternidade tecidos com o fio da sensibilidade resultam em alegria para os encontros, ânimo para a luta diária, força para os instantes de fragilidade e prova, e inclinação para o altruísmo no rompimento dos costumeiros limites, aos quais, quase sempre, guindamo-nos sob o domínio do egoísmo pessoal ou grupal, distanciando-nos uns dos outros na Vinha que é a mesma, e é de todos...

Trabalhar por essa meta é o desafio que a todos nos compete ante as responsabilidades delegadas pelo Divino Rabi e pelo exemplar Allan Kardec.

As bases fraternais na convivência entre os espíritas são os sinais da esperança acenando com as melhores perspectivas nos serviços a serem encetados no porvir do terceiro milênio. Essa é a única garantia de relações capazes a empreendimentos enobrecedores no campo do Espírito.

Trabalhar nas fibras do sentimento, para desenvolver o potencial do afeto cristão, significa direcioná-lo para realizações elevadas do relacionamento na expansão do “ser” - árdua tarefa reeducativa, considerando-se os extensos reflexos de narcisismo e paixão vividos por nós ao longo dos séculos.

Sociedades espíritas afetivas só se concretizam com corações dispostos a amar, e o Amor é suscetível de “treino” e educação para a consolidação de uma conduta amorosa, libertadora e preenchedora.

O Espiritismo abre-nos as portas do entendimento esclarecendo a razão para compreendermos Deus, mas após milênios de naufrágios nas águas turbulentas do religiosismo sem Amor, convém-nos, além de “saber Deus”, o “sentir Deus”, pois é pelas vias sagradas do sentimento que ocorre a fixação dos valores Divinos em nós, conduzindo a crença para os domínios da fé racional, transformando o coração no espelho daquilo que realmente lograremos ser, orientando-nos sempre pelas luzes da imortalidade da alma.

O “Guia e Modelo”, consciente desse assunto, exarou que quem mantivesse o coração limpo veria a Deus, e ver Deus é criar a sublime empatia com Sua obra, vibrando em uníssono com Sua criação, condição essa somente alcançada quando envolvemo-nos na aura do Amor.

O centro espírita, como unidade social do Espiritismo, precisa ser promovido a esse patamar de “escola de afeto cristão”, a fim de não estancar na superficialidade da proposta do Espírito Verdade para a humanidade do terceiro milênio, onde a afetividade será o centro das esperanças de um tempo melhor e a bússola segura para encontrarmos a felicidade em relacionamentos gratificantes e libertadores.

Espiritismo estudado, preciosa chave da informação no cérebro. Espiritismo sentido, alforria espiritual pela transformação do coração.

O terceiro milênio será o verdadeiro tempo de Jesus, liberto do dogmatismo e das negativas tradições passadas, vivido em Espírito e realidade.

Esperançosa em ter colaborado, mesmo que palidamente, com esse objetivo de instaurar um novo tempo para nossas agremiações, muito nos alentará saber que nossas palavras, pelo menos, serviram para deixar claro que a grande causa de nossas vidas é o Amor uns pelos outros acima de quaisquer postulados de caráter doutrinário ou religioso, conforme já fora asseverado pelo Pastor de nossas vidas: “Meus discípulos serão conhecidos por muito se amarem.”

Dois milênios sem ti Senhor, dois milênios que proclamamos teu nome sem honrar-te os ensinos. Ampara-nos para fazermos nos augúrios do terceiro milênio a era do Espírito imortal, ensejando nosso encontro contigo. Fortalece-nos para transformarmos nossos grupos em celeiros de paz e harmonia, lídimos Educandários do Amor, fiéis a teus postulados, conduzindo a sociedade para um milênio de justiça e lucidez sob a égide de Tua bonança. Auxilia-nos Senhor a limpar nosso coração para merecermos a tão almejada condição de Bem-aventurados.

Obrigado Jesus pelo Teu Amor durante esses últimos dois mil anos.

Ermance Dufaux

25 de dezembro de 2000

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Laços de Afeto - Apresentação

Livro: Laços de Afeto
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Harmonia Interior

“Convidamos, pois, todas as Sociedades Espíritas a colaborar nessa grande obra. Que de um extremo ao outro do mundo elas se estendam fraternalmente as mãos e eis que terão colhido o mal em inextricáveis malhas.

O Livro dos Médiuns — Capítulo 29 — Item 350

Pestalozzi estabeleceu em sua filosofia o princípio da interação afetiva como fonte estimuladora da cognição e da aprendizagem. A autora de Laços de Afeto segue-lhe os passos e preceitua, como fio condutor de suas abordagens, as relações afetivas que ensejam uma convivência educativa e plenificadora.

Esse interacionismo na vida relacional, pródigo de Amor, constitui a essência da educação onde quer que ele se manifeste nas atividades humanas, conquanto Ermance Dufaux ressalte o centro espírita na condição de escola em potencial para a construção de relacionamentos afetuosos, libertadores e gratificantes. Chama a comunidade espírita para uma reflexão sobre a necessidade de se criar metodologias e mecanismos que incentivem o cultivo da amizade e da fraternidade, como esteio aos projetos do bem levados a efeito por essas entidades.

Vínculos emocionais superiores despertam forças sublimes do ser que apelam para condições excepcionais de sensibilidade para vir a luz. Por outro prisma, bloqueios que dormitam há séculos nas zonas abissais da subconsciência solicitam elos consistentes de confiança e respeito, para ebulirem sob cuidados que funcionarão como extrema medicação profilática.

Ermance, discreta por estilo, procura quase sempre evitar citações nominais, embora sua pesquisa se inspire em muitos pensadores que abrilhantaram as academias humanas na conquista de sólidos saberes para o progresso social. É assim que, sofrendo as necessárias adaptações e abstraindo-se da técnica, ela busca subsídios em Carl Gustav Jung, Sigmund Freud, Jean Piaget, Howard Gardner, Daniel Goleman, Emmanuel Lévinas, Vygotski, Jürgen Habermas, Antoine de Saint Exupery, apenas para citar alguns dos expoentes a que recorreu em seu trabalho. Deve-se frisar, no entanto, que a base estrutural de sua literatura é Pestalozzi, o senhor Allan Kardec e Jesus, o pedagogo sublime e insuperável.

Laços de Afeto deflagra uma série que carinhosamente intitulamos "Harmonia Interior", cujo objetivo é enfatizar particularidades contidas dentro do universo de sabedoria das obras elementares da revelação nova do Espiritismo. Nesse projeto somamos esforços um grupo de corações que palmilharam as vivências da educação e ciências afins, todos, além de dispostos, muito esperançosos e felizes por terem a benfazeja oportunidade de estabelecer pontes com o mundo físico, cooperando com nossas teorias, agora redimensionadas pela ótica da Imortalidade na qual estagiamos em exuberante vida e plenitude.

Semelhante iniciativa vem em boa hora, considerando os avanços culturais do mundo nesse setor; justo agora em que a UNESCO prioriza a inspirada diretriz dos pilares educacionais para a humanidade do século 21, propostos pelo relatório Jacques Delors (1). Inaugura-se um tempo novo para os roteiros e currículos de aprendizagem assentados nos quatro pontos: aprender a ser, aprender a fazer, aprender a conviver, aprender a conhecer, em favor de uma educação mais humanitária e centrada em valores e habilidades do homem, assumindo sua verdadeira condição de sujeito de sua jornada de crescimento em direção à felicidade e à paz.

Agradeçamos juntos a Deus, Pai de Amor infinito, pelas perspectivas de Laços de Afeto através da palavra confortadora e afetuosa, repleta de estímulo e ponderação, de nossa amiga Ermance. Ante a responsabilidade que nos aguarda, renovemos nossos ideais e caminhos para atendermos ao convite sábio exarado pelo senhor Allan Kardec há mais de cento e quarenta anos, trabalhando para que todas as sociedades espíritas colaborem na grande obra regenerativa da humanidade, solidificando, primeiramente, entre suas paredes o clima do Amor cristão e humanitário, envolvendo em seguida todas as demais instituições similares, de um a outro extremo do mundo, com abundante fraternidade, dissipando as sombras do mal.

Helena Antipoff

25 de Fevereiro de 2001


1. A fundação francesa Jacques Delors se encarregou de organizar o relatório desenvolvido por vários especialistas de todo o mundo, que compõem a Comissão Internacional sobre Educação para o Século 21. Este relatório, concluído em 1996 é a base da UNESCO para orientar seus projetos de ação. Maiores informações no livro “Educação - Um Tesouro a Descobrir’ - Editora Cortez - MEC.

Laços de Afeto - Sinopse

LAÇOS DE AFETO

ERMANCE DUFAUX



SINOPSE

"Sociedades espíritas fraternas só serão construídas por homens e mulheres mais dóceis e cordiais, mais confiantes e afáveis, mais amigos e amáveis. A criação dessas novas relações é garantia de uma aprendizagem mais sólida e bem aproveitada em nossas casas espirituais, facultando melhor assimilação dos conteúdos doutrinários e sua consequente aplicação no desenvolvimento de habilidades morais e emocionais, tão escassas na convivência entre as criaturas perante a pressão das lutas da vida terrena. Teremos assim, mais afeto, melhor ambiente e bem-estar para conviver, e maior motivação para servir e aprender!"


quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Solidariedade aos Tarefeiros Espíritas

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 34

"Qual o verdadeiro sentido da palavra caridade, como a entendia Jesus?"
"Benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros, perdão das ofensas."

O Livro dos Espíritos - Questão 886

Precisamos rever nossos atos solidários para com o trabalhador espírita. Necessitamos repensar planos de serviço e priorizar o trabalhador para que o trabalho frutifique com mais abundância e utilidade geral.

Nossa referência não diz respeito, tão somente, a capacitá-lo para as responsabilidades doutrinárias, e sim em instrumentalizá-lo de condições emocionais para a vida. O endosso de nossa tese encontramo-lo na profunda solidão e amargura que têm carpido muitos servidores, que a despeito de estarem "prontos" para a tarefa, não se encontram preparados para viverem em paz.

O ponto de análise está na sutilidade da relação entre estar pronto para ajudar e estar pronto a se ajudar.

Convencionou-se em nossas fileiras doutrinárias o amor ao próximo como sadio programa de vida e equilíbrio. Uma ideia correta, mas não completa.

A plataforma de amor dentro da ética universal, exarada pelo guia e modelo da humanidade, inclui também o amor a Deus e a si.

Quem se ama descobre os caminhos da autêntica liberdade.

Faz-se luz e amor a outros, contudo, todo espírita sincero deve indagar de si mesmo, frequentemente, se está adquirindo sua própria luz como conquista inalienável.

O decantado encontro consigo mesmo, muita vez, é penoso, sacrificial.

O mau entendimento dessa questão moral tem ocasionado uma campanha intensa pelos exercícios de caridade organizada e distraído o espírito de resgatar-se a si próprio.

Ama-se muito o próximo, sem aprender a amar-se.

Sem generalizações, e muito menos desvalorizando as iniciativas assistenciais de nosso movimento, quase sempre essas tarefas constituem campos de treinamento do hábito de amar e da sensibilização do afeto para com o outro, sem apontar caminhos para como estabelecer o autoencontro, o amor a si.

Os centros espíritas devem se empenhar na tarefa de ensinar a debater temáticas sobre a realidade íntima do ser, desdobrando-se em iniciativas preparatórias para que os servidores possam auferir mais amplas possibilidades em favor do próximo, mas, igualmente, de si mesmos.

A análise do Espírito Verdade sobre a caridade não deixa dúvidas. Benevolência, indulgência e perdão são movimentos íntimos da alma, caminhos da caridade para com o outro, mas acima de tudo é luz que se acende no coração e com a qual devemos iluminar o próprio destino.

Por isso, convém reunirmos os grupos doutrinários em eventos de debate e lançar a intrigante questão:

Por que expressiva parcela dos trabalhadores espíritas está gerando tanta luz para os outros e não a consegue reter em si mesmos?


quarta-feira, 16 de setembro de 2020

Espiritismo Por Dentro

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 33

"A benevolência para com os seus semelhantes, fruto do amor ao próximo, produz a afabilidade e a doçura, que lhe são as formas de manifestar-­se. Entretanto, nem sempre há que fiar nas aparências. A educação e a frequentação do mundo podem dar ao homem o verniz dessas qualidades. Quantos há cuja fingida bonomia não passa de máscara para o exterior, de uma roupagem cujo talhe primoroso dissimula as deformidades interiores! O mundo está cheio dessas criaturas que têm nos lábios o sorriso e no coração o veneno; que são brandas, desde que nada as agaste, mas que mordem à menor contrariedade; cuja língua, de ouro quando falam pela frente, se muda em dardo peçonhento, quando estão por detrás." Lázaro (Paris, 1861)

O Evangelho Segundo o Espiritismo - Capítulo 9 - Item 6

O casal Andrade e seus filhos eram integrantes ativos da organização doutrinária que patrocinava um grande evento espírita naquela pequena cidade. O explanador da ocasião havia sido recebido naquele lar com muita gentileza por parte de seus anfitriões. Durante o almoço, o marido esmerava-se em gestos e posturas de cordialidade buscando atender convenientemente o visitante, no entanto, sua esposa mantinha-se taciturna, com um olhar de revolta.

O orador, porque era médium de faculdades educadas, aguçou suas antenas psíquicas na verificação do que passava com Dona Anastácia, captando intensa dor e tristeza nos sentimentos da sua anfitriã.

O evento realizou-se durante a tarde e parte da noite. No retorno ao lar, novamente a cena instalava-se à hora do repasto noturno, sendo que desta feita a esposa conturbada sai aos prantos da mesa, em crise inesperada. O palestrante, preocupado com o ocorrido, indaga ao esposo se algo poderia fazer e recebe queixas e deboches insensíveis do marido. Resolve então por solicitar um diálogo com Anastácia e ela, sem pestanejar, desabafou dizendo: "eu gostaria que meu marido tratasse-me com um centésimo da finura com a qual ele tem tratado o senhor como nosso visitante!"

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"Espiritismo de aparências". "Espiritismo de superfície".

A assimilação das propostas éticas da doutrina seguem uma sequência natural e paulatina de maturidade. Primeiro atinge as ideias, posteriormente penetra os sentimentos e, por fim, renova as atitudes. Evidentemente, não será possível estipular uma separação perceptível entre essas etapas, porque elas se complementam e interagem sem que haja uma nitidez sobre seus efeitos.

Na pequena historieta acima nota-se que o esposo de Dona Anastácia apresentava uma fachada para os que são de fora do lar, mas na intimidade era um homem rude com sua companheira. Durante um estágio do processo de renovação espiritual, essa conduta, inevitavelmente, fará parte do contexto do aperfeiçoamento. O incômodo decorrente dessa situação levará o aprendiz da espiritualização a buscar uma coerência entre suas forças interiores na aquisição de sua própria paz. Todavia, se o aprendiz não se devotar o suficiente poderá permanecer demasiadamente no "Espiritismo de adorno"...

Pensamento, sentimento e ação são vivências que a princípio se contrapõem nessa escala do crescimento moral. Pensa-se algo, sente-se diversamente e age-se em dissonância com ambos. Uma desarmonia existe entre as três potências da alma. O esclarecimento espírita atinge o campo do pensar permitindo que a reflexão conduza o homem a novas formas de entendimento e avaliação de sua existência, no entanto, a transformação do sentir e os cuidados com as atitudes são os verdadeiros indicadores de que essa informação intelectiva está sofrendo uma metamorfose na intimidade, através do acionamento da vontade e do esforço na mudança de hábitos e reações perante os fatos da vida.

Espíritas que se aplicam na reforma interior não são identificados por suas ações no campo das aparências, que podem não passar de verniz ou máscara para dissimular suas imperfeições e impressionar com qualidades que não adquiriu, mas são reconhecidos por suas reações aos testes de cada hora onde estiver. A forma de reagir a uma ofensa, a uma perda, a uma traição aferem a qualidade das mudanças que realmente temos operado no sentimento e se temos o Espiritismo de aparências ou por dentro. Como diz Lázaro: "(...) são brandas, desde que não as agaste, mas que mordem a menor contrariedade," isso é uma reação.

As poses religiosas sempre fizeram parte das atitudes humanas no intuito de convencer o outro daquilo que não convencemos a nós próprios. Essa atitude é reflexo do orgulho em querer parecer o que ainda não somos para fruir das sensações de que estamos sendo admirados e prezados pelos outros. Além de orgulho, também é escassez de auto-estima, é a mendicância da consideração alheia apresentando "falsos dotes" para chamar a tenção e conquistar o apreço. Genuflexões, voz mansa, abraços calorosos, sorrisos de alegria são bons modos que podem, algumas vezes, esconder propósitos falsos ou interesses escusos de prestígio.

Essa "santidade de superfície" pode ser considerada natural nos primeiros tempos do contato com as Revelações Novas na vida da criatura até que ela se ajuste a uma conduta que melhor expresse a sua realidade. Mas para aqueles que passam os anos detendo-se nesses "chavões de puritanismo", podem estar sofrendo de "negação psicológica", ou seja, a manutenção de algum mecanismo de defesa que impeça de analisar-se com sinceridade e construir a auto-aceitação. O orgulho, como doença da alma, é habilidoso o bastante para gerar uma "capa de ofuscamento" das nossas imperfeições e criar uma "miragem encantadora", com virtudes que ainda não desenvolvemos, nas quais ele nos faz acreditar. Até certo ponto é uma forma natural de se proteger da angústia e da aflição provocadas pelo autoconhecimento que produz o esclarecimento espírita, angústia decorrente do contato com a nossa inferioridade. É muito doloroso reconhecer nossa verdadeira condição espiritual...

Aprender a ser nós mesmos, aprender a conviver pacificamente com nossos conflitos, aprender a dividir as nossas angústias com alguém na busca de caminhos, aprender a lidar com autenticidade, essas são algumas das lições do Espiritismo por dentro.

Ardilosos adversários espirituais da nossa causa têm explorado habilmente a fragilidade do "psiquismo místico" de várias criaturas que aderiram aos princípios renovadores da imortalidade. Não conseguindo desanimá-las da frequência às atividades, optam então por incentivaras celeumas e atenções de amigos queridos com assuntos de exterioridade, insuflando sofismas de toda espécie que formam crenças e crentes em assuntos de menor importância para nossas fileiras, dilatando o grupo daqueles que se tornam oponentes em discussões estéreis que perturbam o clima vibratório dos ambientes. Além disso, é dessas discussões estéreis e precipitadas que costumam surgir as teses que fortalecem o institucionalismo nas práticas e conceitos doutrinários, através do rigorismo que enaltece a pureza por fora, mas que não cogita da pureza por dentro, nos recessos do coração.

Na lista dos temas preferidos estão as fórmulas de desenvolvimento das práticas doutrinárias, distraindo-se com opiniões personalistas e que pouco acrescem ao bem das realizações das quais fazem parte. Enquanto se discute sobre questões de fora, esquece-se das questões íntimas, que são mais difíceis de serem tratadas e pensadas quando em um grupo de trabalho. Usa-se ou não luzes coloridas, come-se ou não a carne, bebe-se ou não os alcoólicos, dá-se ou não o passe com olhos fechados, coloca-se ou não uma placa com o nome do centro na via pública, lê-se ou não a obra de tal autor não considerado espírita, coloca-se ou não as garrafas destampadas para fluidificar a água, permite-se ou não a incorporação mediúnica, ora-se ou não de olhos abertos. A lista não para, é interminável.

Outras vezes, a sutil interferência obsessiva opera-se na velha tradição ético-religiosa de estipular padrões de conduta na forma: "espírita faz isso e não pode fazer aquilo". Assuntos, todos eles, que podem até ser interessantes discutir, mas que têm provocado um movimento de inutilidade e obsessão em razão da forma infantil como são tratados, dando-lhes exagerada importância e priorizando o exterior em detrimento da essência - um reflexo natural dos mecanismos de defesa, com os quais grande maioria dos homens encarnados lidam na atualidade.

Seria mais interessante, embora penoso, discutir o que faremos para perdoar um inimigo, como vencer um hábito sexual, como vencer impulsos menos dignos para com alguém, como ser uma criatura agradável onde vivemos, porque nos defendemos com uma determinada forma de agir, qual a razão de nos irritarmos perante um fato específico, qual a origem de certas fantasias que nos acompanham compulsivamente, porque determinada tarefa é trabalhosa para nós, onde as causas da preguiça para estudar, como se sentir motivado para a leitura edificante, o que podemos fazer para ajudar alguém que todos querem excluir, qual a causa dos pensamentos de vingança que costumam surgir na nossa tela mental, quais os traumas da infância que ainda nos influenciam na adultidade, o motivo da atração ou rejeição por uma pessoa em particular... São muitas perguntas e incursões das quais, costumeiramente, afastamo-nos. Nisso reside os embriões para a instauração do Espiritismo por dentro!

Deixemos claro a esse respeito que não foram os ritos de fé e nem o sacramentos nas ideais que desviaram a sublime missão da mensagem da Boa Nova, e sim o sentimentos com os quais os homens se trataram mutuamente perante o entendimento de tais caminhos, nas trilhas sombrias da fé exterior. Se os costumes e posturas humanas tivessem sido burilados no caráter nobre e na ação correta criando relações de amor, mesmo com castiçais e velas, missas e igrejismo, conduziríamos a fé aos patamares da maturidade e da elevação espiritual. Contudo, todos os paramentos e sistemas da "eclésia" constituíram graves problemas para a humanidade, porque atrás dos regimes religiosos havia acendrado orgulho sustentando a sede do homem pela supremacia da verdade, assim como hoje existem muitos espíritas repetindo essa malfadada lição...

Sem temor algum, concluímos que ritos e poses em momento algum são os problemas que pesam sobre o futuro espiritual que espera os homens espíritas, mas, acima de tudo, a luz que não souberam ou não quiseram dilatar nos reinos do coração, perante os luminosos raios da Verdade entregues gratuitamente a todos os adeptos, nos seus caminhos de cada dia.


terça-feira, 8 de setembro de 2020

Vencendo o Personalismo

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 32

Admirai, no entanto, a bondade de Deus, que nunca fecha a porta ao arrependimento. Vem um dia em que ao culpado, cansado de sofrer, com o orgulho afinal abatido, Deus abre os braços para receber o filho pródigo que se lhe lança aos pés. As provas rudes, ouvi-­me bem, são quase sempre indício de um fim de sofrimento e de um aperfeiçoamento do Espírito, quando aceitas com o pensamento em Deus.

O Evangelho Segundo o Espiritismo - Capítulo 14 - Item 9


Espíritos saindo primarismo para conquistas medianas, nossa principal qualidade é a disposição de mudança na melhoria íntima, já que nos arrependemos sinceramente do mal. Iniciamos, a exemplo do filho pródigo do Evangelho (1), a nossa viagem de volta à Casa Paterna buscando aconchego e a dulcificação do amor.

Essa volta, porém, exigir-nos-á o preço da reeducação, a começar pelo personalismo que se solidifica na intimidade como um dos pilares de nossas imperfeições.

Podemos entender o personalismo como sendo o apego com tudo que parte de nós. Esse apego é fator sinalizador de gratificação afetiva escassa conosco mesmo, insuficiência de auto-amor. Quando nos amamos verdadeiramente não há motivo para a atitude personalista, porque nos realizamos com o ato de ser sem aguardar compensação, aplauso e possessividade.

Seu traço mais comum é a paixão crônica com o eu manifestada de formas variadas, algumas delas são: irredutibilidade velada ou clara, vaidade intelectual, dificuldade de conviver pacificamente com a diversidade humana, manipulação interpretativa de conceitos, autoritarismo nas decisões, boicote na cooperação a projetos que partam de outras cabeças, agastamento ante as cobranças e correções, sistemática competição para produzir além dos outros e da capacidade pessoal, coleção de animosidades, excessiva valorização que conferimos a nós mesmos, "amor" próprio, apego às nossas obras, superlativa fixação dos valores que possuímos ou acreditamos possuir, pretensões de destaque e vício de ser elogiado.

Suas causas podem ser encontradas nas história remota da evolução, quando tivemos no instinto de conservação um importante fator de fixação e agregação de valores morais consolidando a consciência de si. A conservação como fonte de defesa e automatização da consciência de si tornou-se egoísmo, uma exageração dessa necessidade natural, na qual nos encontramos até hoje.

Na infância encontramos outras tantas razões muito bem abordadas por Sigmund Freud na questão da personalidade egocêntrica, cujo processo de amadurecimento psíquico é mal conduzido, ensejando carências afetivas profundas que irão refletir no homem adulto como insegurança e fantasias narcisistas.

Em torno de seus passos sempre se encontram a fama, o autoritarismo, a vaidade, o desejo de realce, a inveja: "súditos do império do eu".

Tendo subtraída a empatia, o personalista é alguém que não sabe dialogar, dividir, intercambiar. Não sabendo interagir com o outro, entender-lhe os motivos e necessidades, está sempre com uma "receita de viver" nos lábios, impedindo-se da mais nobre ação íntima da caridade que é o ato de compartilhar vivências com o ser alheio.

Como seu dinamismo é a centralização no "eu", a reeducação dessa tendência está em aprender a ouvir o outro. O ato de ouvir não se restringe a escutar palavras. Ouvir é o estado de plena receptividade para o outro, independentemente de quem seja.

Essa conquista será um exercício doloroso para o personalista. Exigirá desprendimento, humildade, assertividade, falar menos e meditar mais. Ouvir significa cultivar sensibilidade para com aqueles que nos rodeiam; sensibilidade que nos permita sempre um foco positivo do próximo entendendo-lhe as razões, ainda que esteja em equívoco, abrindo-se para ser-lhe útil, desarmado de pré-conceitos. Ouvir é aprender a receber críticas e admoestações até daqueles que nos parecem despreparados para fazê-las, habituando-se a indagar a real utilidade e importância das ideias pessoais. Ouvir é alteridade, respeito às singularidades de cada um. A partir daí se aprende a construir uma relação altruísta, pacífica e saudável com as diferenças e os diferentes, nas experiências de todo instante.

A vitória sobre o personalismo, portanto, está em sair de si acolhendo o outro diferente do eu com interesse altruísta e fraterno, aprendendo a "esvaziar-se do ego", sentindo o outro.

O retorno à Casa Paterna inclui o ato de desprender-se de si para ouvir o Pai. Tal lição será aprendida na escola da convivência diuturna com quantos passem pelos nossos caminhos.

Fazendo assim assumiremos definitivamente a condição de filhos pródigos em plenitude de sintonia com as riquezas de Deus, aprendendo a ouvir-Lhe os alvitres no foro da consciência, em favor da nossa felicidade.

1. Lucas 15:20


sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Severos, Porém, Sem Culpa

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 31

"Sede, pois, severos para convosco, indulgentes para com os outros." 
José, Espírito protetor (Bordéus, 1863)

O Evangelho Segundo o Espiritismo - Capítulo 10 - Item 16

Severidade conosco significa vigilância mental ativa, crescente e permanente para não permitirmos hiatos nos esforços educativos das nossas inclinações. Esse cuidado com a personalidade é essencial ao progresso moral e espiritual, porque é exatamente nos instantes de relaxamento interior que costumam brotar o derrotismo, a obsessão e as más ideias; é quando se percebe com mais clareza as insatisfações que vinham sendo esquecidas e superadas no trabalho do bem, mas que sob uma análise descuidada podem tomar proporções onerosas aos projetos de elevação nos quais nos encontramos incursos, levando a decisões precipitadas e imprevisíveis.

Limite tênue existe entre severidade como regime de disciplina e o sentimento de cobrança que conduz-nos a querer fazer o que ainda não damos conta. Uma imposição para a qual não temos preparo, sendo injustos conosco.

Em tudo deve vigorar o equilíbrio. A recomendação de José, o Espírito protetor, não deve ser entendida como uma atitude de inflexibilidade e castigo a nós mesmos. Ser severo com compassiva tolerância às nossas fragilidades é o que sugere o bom senso e a caridade. Auto-aceitação sem conivência.

No entanto, o sentimento de culpa, com suas lamentáveis consequências, tem comparecido em boa parte dos aprendizes da doutrina espírita em razão de reminiscências da condenação eterna, fundamento da formação religiosa tradicional. Surge na forma de sutil desconfiança na possibilidade verdadeira de crescimento e melhoria individual, gerando uma atmosfera de descrença nos ideais e no seu próprio esforço. Quanto mais passa o tempo, mais a criatura estabelece cobranças no seu aperfeiçoamento moral e, não atingindo os patamares desejados, cai no desânimo e na deserção.

Por conta dessa sábia instrução contida na codificação, muitos corações idealistas, portadores de valores forjados no sacrifício da renovação interior, habituaram a julgar-se hipócritas e desleais perante seus deslizes, penetrando as faixas emocionais da autopunição em descaridosos episódios de desamor a si próprios. Nesse quadro, esquecem-se do quanto já edificaram de bom na intimidade e optam por fixar-se em crenças negativas, supervalorizando suas imperfeições, negando autoperdão, caminhando para conflituosos estados íntimos que ativam os sentimentos de desprezo, raiva, desânimo, ansiedade, tristeza, desespero e pessimismo.

Grande diferença existe entre "ser imperfeito" e "estar imperfeito". Não fomos criados para o sofrimento e o mal. O fato de cometer faltas não intencionais faz parte do demorado processo de transformação da personalidade. Os que verdadeiramente nos comprometemos com a melhoria interior precisamos nos dar conta de que as vacilantes intenções de ser um homem novo necessitam do otimismo para se concretizar. Não somos infelizes, estamos, passageiramente, deprimidos. Somos luzes, somos deuses...

Trágico equívoco acreditar na perfeição instantânea depois de milhares de anos no cultivo intencional de ervas daninhas no solo do coração. Conhecimento não basta. Quando Jesus afirma o valoroso ensino Conhecereis a verdade e ela vos libertará¹, certamente não se referia à verdade que permanece na órbita do cérebro, porque se assim fosse todos os espíritas, detentores de largos fachos de luz da verdade, estariam libertos da lutas contra a inferioridade que ainda nos aprisiona nas celas da vaidade e do orgulho. O Mestre, evidentemente, referia-se à verdade que atinge as distantes regiões do coração, à verdade sobre nós mesmos, a nossa realidade.

Mister efetuar o serviço delicado nas leiras do sentimento, aprendendo a arar as tendências, hábitos e desejos em direção aos roteiros do bem. Mergulhar na vida profunda do inconsciente - o desconhecido reino do automatismo - e pesquisar as raízes afetivas de nossas vivências.

Culparmo-nos, pelo mal que ainda não conseguimos vencer, em nada nos melhora. Certamente em alguns casos de personalidade rebelde ela funciona como uma defesa a fim de não desistirmo-nos de lutar, impulsionando a criatura ao recomeço para não agir novamente da mesma forma. Afora isso, é um instrumento pouco eficiente para promover a correção.

Melhora real só obteremos com auto-estima, valorizando, severamente, a "parte boa" que possuímos, fixando as crenças no "homem novo" que já desejamos ser, guardando o "olhar mental" na meta gloriosa de ser hoje melhor que ontem, sem distrair com os chamados inferiores do "homem velho" que agoniza, mas teima em ressuscitar...

Culpa é tortura e desamor, impulso para baixo.

Severidade é crescimento e auto-amor, motivação para continuar nos desafios de aprimoramento.

Jamais desistamos da melhora. O tempo e a maturidade demonstrarão como é preenchedora a opção que escolhemos sob a égide dos luminosos ideais espíritas-cristãos. Sem perfeccionismo e fazendo o melhor que pudermos, experimentaremos a alegria da vitória, cujo troféu chama-se felicidade.

1. Jo 8:32.

domingo, 9 de agosto de 2020

Missão dos Inteligentes

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 30

Não vos ensoberbais do que sabeis, porquanto esse saber tem limites muito estreitos no mundo em que habitais. Suponhamos sejais sumidades em inteligência neste planeta: nenhum direito tendes de envaidecer-vos. Se Deus, em seus  desígnios, vos fez nascer num meio onde pudestes desenvolver a vossa inteligência, é que quer a utilizeis para o bem de todos; é uma missão que vos dá, pondo-vos
nas mãos o instrumento com que podeis desenvolver, por vossa vez, as inteligências retardatárias e conduzi-las a ele.

Ferdinando, Espírito Protetor. (Bordéus, 1862)

O Evangelho Segundo o Espiritismo - Capítulo 7 - Item 13

Não somos a inteligência que amealhamos. Apesar disso, muitos a tratam como se fosse o traço mais valoroso da personalidade em razão dos sentimentos que o saber humano dinamiza no coração.

Ainda hoje, expressiva maioria das criaturas guarda agradável sensação de superioridade quando detentora da largas fatias de cultura e desenvoltura cognitiva. Possuí-la não é o problema, mas sim como nos enxergamos a partir do saber que acumulamos, porque o orgulho costuma encharcá-la de personalismo e vaidade criando uma paixão pela auto-imagem de erudição no campo mental.

Os homens de saber de todas as épocas, com poucas exceções, foram criaturas que sucumbiram sob o peso da vaidade. A capacidade para manejar a inteligência nem sempre era acompanhada pela habilidade em lidar com os sentimentos que decorriam do destaque e da lisonja com que eram tratados.

As pessoas inteligentes e cultas, não raro, tornam-se muito exigentes e excedem na avaliação acerca de sua importância perante o mundo; isso colabora para diminuir a proximidade espontânea em função de criarem conceitos que desnivelam seus relacionamentos, com propósito de manterem as imagens que cultuam de si próprias. Tais exigências são sustentadas pelo sentimento de onipotência originado dos estímulos sociais, que conceituam cultura como o quesito de realização pessoal dos mais importantes na Terra.

O que ocorre em nosso mundo interior, a partir da relação que travamos com a instrução que conquistamos, é fator fundamental para nossa felicidade. Num mundo que privilegia a inteligência como sinônimo de acúmulo de informações e abre os braços para os eruditos, marginalizando os incultos, é óbvio que essa faceta social promove na intimidade do homem um conjunto de fenômenos emocionais que influenciam, decisivamente, seu processo de crescimento espiritual. Quantos pais, por exemplo, educam seus filhos com a noção de sucesso e felicidade, realização existencial e vitória, conciliando-os com dinheiro e intelectualidade?

Portanto, que contingência cerca a alma no mundo do afeto a partir desse quadro?

Precisamos de melhores aferições nesse tema, porque se para o homem comum isso não passa de uma questão de oportunidade e competição social, para nós, que fomos agraciados com o saber espírita, torna-se uma questão de desafio e aproveitamento reencarnatório.

Conscientes de que a tarefa do homem inteligente no mundo é conduzir a humanidade para Deus, conforme assinala Ferdinando no trecho acima destacado, fica para nós a indagação: o que temos feito com a inteligência e a cultura em favor da comunidade onde estamos inseridos? Façamos alguns levantamentos:

Como tem procedido nesse sentido o médico espírita? Tem conseguido passar a seus pacientes a noção afetiva do Pai durante as suas oportunas consultas? Tem conseguido equacionar seus problemas de relacionamento com seus enfermos, buscando maior calor humano? Tem havido um desejo de pesquisar as razões subjetivas do sofrimento de seus beneficiados ou permanece na confortável poltrona da diplomacia universitária? Há o interesse em desbravar novos horizontes em torno das próprias pesquisas humanas na reciclagem da fragmentária informação acadêmica?

E os missionários das ciências psíquicas? Têm se permitido serem fraternos com seus consulentes ou preferem a frieza do divã e dos psicotrópicos? Têm conseguido entender seus pacientes como familiares queridos que a vida colocou em seu caminho ou como almas atordoadas e sem futuro? Têm conseguido aplicar-lhes a excelente medicação da esperança e caridade, somente possíveis quando se permite sensibilizar-se com os dramas alheios? E com o montante de informes que possui, como têm procedido perante a vida? Têm utilizado da sabedoria da vida inconsciente para si mesmos, resolvendo suas próprias lutas interiores, ou têm apenas se deliciado com o ato de destacar-se como profissional aquilatado em congressos e eventos, que infundem ainda mais a sensação de grandeza e domínio em relação ao "mundo desconhecido" das técnicas e caminhos da vida mental?

E o autodidata espírita? Como tem usado o que sabe? Tem promovido criaturas ou usado de seu tesouro para consolidar posições de "homens com todas as respostas"? Tem relativizado os assuntos espirituais ou tem agido com certezas conclusivas sobre temas extremamente versáteis da metafísica? Tem procurado tornar útil à comunidade sua bagagem doutrinária ou tem se encastelado no preciosismo de gastar enorme tempo para construir teorias talhadas no perfeccionismo? Tem sabido ouvir opiniões diversas com caridade e proveito ou se mantido no círculo estreito de suas ideias, originadas em fartas pesquisas que lhe causam a impressão de descobertas inusitadas?

Somente crendo que há algo superior regendo os mecanismos do universo, e compreendendo nossa realidade nesse contexto sistêmico da Leis Naturais é que teremos recursos para agir com consciência acerca do nosso papel na harmonia cósmica.

O que importa é aprender a usar a inteligência para despertar nas almas o desejo de serem solidárias na vida e consolidarem a ideia de Deus no coração - algo extremamente escasso na atualidade, considerando que mestrados e teses quase sempre são defendidos com o único propósito de melhorar proventos financeiros...

Cultura é indício de compromisso. Inteligência é traço mental solicitando o complemento do amor para conduzir o homem aos rumos do bem. O dever natural de quem sabe mais é ajudar quem sabe menos a entender o que vale a pena saber para ser feliz, é tornar-se responsável pelo meio onde labora auxiliando entendimento e cooperando com o progresso.

Pouco importa para um espírita culto a mais avançada técnica da atualidade, se ele não souber incutir dentro de si e dos outros a alma da vida, o amor.

Despertar nos seres humanos o gosto de servir, o respeito à natureza e o sentimento da existência de Deus é a grande missão do homem espírita inteligente na Terra. Se, ao contrário, preferir manter-se nas gélidas posturas do homem científico, que separa academicismo e espiritualidade, estará repetindo velhos erros e sendo iludido pela crueldade sutil da soberba e da necessidade de prestígio. A consequência mais grave desse quadro é o sentimento de auto-suficiência em que estacionará, supondo encontrar nos valorosos avanços da ciência humana o essencial para cumprir sua missão, ou mesmo cultivar a velha ilusão de que conhecimento é sinônimo de elevação espiritual.

Espiritismo sempre se mãos dadas com a ciência e a sociedade: essa é a plataforma sobre a qual devemos nos conduzir nos assuntos da inteligência, sem que um se sobreponha ao outro. Esse o desafio!

Fica claro que, para conseguir esse objetivo, somos convidados a severo regime de auto-análise sobre quais são as motivações e tendências que movimentamos, perante a cultura que adquirimos em alguma matéria específica do saber mundano, ou mesmo nas experiências da lavoura doutrinária.

Renovemos o conceito de cultura à luz dos princípios espíritas e da educação.

Igualmente reciclemos a noção de inteligência à luz da ciência humana, absorvendo as "novas" noções da multiplicidade desenvolvida por Howard Gardner¹.

Cultura é convite a realizar mais e melhor. Inteligência é um conjunto de habilidades que nem sempre significa muita cultura.

Procuremos saber com clareza também se não estamos sofrendo de "poluição intelectual", ou seja, se temos sabido ser seletivos relativamente ao conhecimento, porque há um "lixo" nas ideias terrenas que, em princípio, parecem ser temas extremamente importantes e essenciais, mas que não oferecem nenhuma utilidade para a conquista da paz, da saúde e do crescimento dos povos.

Muita informação pode não passar de "escora para interesses pessoais", quando o importante é saber converter a informação em agente de transformação pessoal e coletiva onde nos situamos. Em muitos casos, a sede do conhecimento pode camuflar complexos fenômenos da vida afetiva, nos capítulos da carência e da frustração.

Ser bem informado e guardar simplicidade - a virtude das almas solidárias - eis o convite para todos nós.

Ter respostas simples para coisas complicadas é a grande virtude do homem inteligente na Terra, porque somente vibrando no espírito da simplicidade é que somos capazes de tornar o saber uma alavanca propulsora, nos rumos da felicidade e da libertação entre os homens.


1. PHD em psicologia pela Harvard University. Criador da teoria das Inteligências Múltiplas.

sábado, 1 de agosto de 2020

Perfis Psíquicos

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 29


"Os que no Espiritismo vêem mais do que fatos; compreendem-lhe a parte filosófica; admiram a moral daí decorrente, mas não a praticam. Insignificante ou nula é a influência que lhes exerce nos caracteres. Em nada alteram seus hábitos e não se privariam de um só gozo que fosse. O avarento continua a sê-lo, o orgulhoso se conserva cheio de si, o invejoso e o cioso sempre hostis. Consideram a caridade cristã apenas uma bela máxima. São os espíritas imperfeitos."

O Livro dos Médiuns - Capítulo 3 - Item 28



Alma querida confidenciou-nos, nos círculos de aprendizado da erraticidade, que se encontrava muito surpreso com as revelações descerradas pela morte física, acerca dos estudos sobre os perfis psíquicos adquiridos por cada espírito no somatório de suas existências carnais. Analisando com mais atenção as características atinentes aos espíritas, deparou-se com informes que muito lhe levaram a meditar. Agora compreendendo melhor quais as forças morais e espirituais que medeiam as personalidades vinculadas às orientações do Consolador, solicitou-nos que, quando possível, enviássemos aos amigos domiciliados na Terra alguma nota acerca de suas conclusões.

Atendendo-lhe o pedido gentil e caridoso, passamos fielmente, na condição de mensageira, os apontamentos de nosso interlocutor, como segue:

"Nas vésperas de meu desencarne, os temperamentos dos espíritas foram alvos de profundas preocupações de minha parte. Suas atitudes faziam-me recordar a trajetória religiosa do homem comum, e isso a mim intrigava. Somente na vida espiritual pude compreender com mais lucidez a questão dos perfis espirituais que definem os temperamentos e o caráter, encontrando então respostas convincentes a muitas de minhas dúvidas.

Em registros similares ao da ciência humana, vim a deparar-me com volumosa literatura destinada a estudos antropológicos e sócio-espirituais. Em capítulo específico tomei conhecimento de belíssimo e incomparável estudo sobre os perfis evolutivos, minudenciando características psíquicas e traços emocionais sobre os mais variados protótipos da sociedade humana.

Com interesse, aprofundei nas reflexões sobre os religiosos de todos os tempos, e pude assim melhor entender o perfil espiritual dos espíritas, que merece abordagem detalhada em tais compêndios antropológico-espirituais.

Considerei então o significado de algum dia poder transmitir aos amigos na Terra algo de minhas conclusões, objetivando cooperar no esclarecimento e alerta. Deixo assim minhas anotações na seguinte linha de ideias:

Compulsando literatura especializada do plano extrafísico,  pude perceber a antropogênese sócio-espiritual das almas que hoje são atraídas para as fileiras do Consolador.

Apenas para compor anotações com finalidades de despertamento, em breves linhas descreverei algo sobre a "personalidade espiritual" dos mesmos nos últimos dois mil anos.

Amantes incondicionais dos ensinos da figura excelsa de Jesus, habituaram-se ao discurso do bem, seguindo-lhe as palavras, mas sem a prática.

Exímios exegetas dos textos evangélicos, entregaram-se ao costume de interpretar-lhe para obter vantagens pessoais, em franco desrespeito à opinião alheia.

Dedicados estudiosos da letra evangélica, passaram-se a julgar representantes Divinos e exclusivos portadores da Verdade, estabelecendo tribunais aos que não lhes atendiam aos interesses.

Dotados de grande influência, arregimentaram adeptos e ramos religiosos, elegendo a exclusão  e a heresia para os desleais.

Fascinados com a hierarquia eclesiástica, disputavam a qualquer preço a ordenação e o destaque, a fim de lograrem o aval dos cargos para perpetrar os abusos do poder.

Detendo o monopólio do saber, incensaram dogmas e sacramentos como instrumentos de fé fácil e negociável.

Agravando a condição espiritual de tais perfis, as anotações davam conta que nos últimos seiscentos anos acostumaram-se à adoção popular de lavrar sentenças infalíveis e condenatórias, em julgamentos acerca das atitudes alheias em deplorável atitude de intolerância, resquício moral da ação de Gregório IX que em 1231 oficializou os "tribunais da vergonha" elegendo os padres domini-canes, ou "cães do senhor", como herdeiros da "gloriosa missão" de torturar fisicamente os heréticos.

Em linhas gerais, semelhantes condutas talharam um "caráter espiritual" típico e peculiar que define a grande maioria dos "espíritos-espíritas", resumidos assim:

- Não habituaram a terem suas interpretações pessoais contestadas.

- Acostumaram-se a fazer do seu conhecimento intelectual a verdade que ainda não aprenderam a sentir.

- Encantam-se com a ritualização exterior como forma de desonerarem-se das obrigações íntimas, adulando guias, responsabilizando obsessores, amando cargos, práticas e idolatria.

- Guardam imensa dificuldade de amar a quantos  não lhes partilham os pontos de vista, contagiando-se facilmente com a animosidade crônica.

- Nutrem acentuada desconfiança uns nos outros em razão de suas infidelidades e desonras de outrora.

Assim, conquanto amantes do bem, percebi pelos informes, que seus descuidos eram mais fruto da imaturidade que da perversidade, embora isso não tenha sido suficiente para desonerar-lhes de muita dor e do confinamento a regiões infelizes da erraticidade, retomando reencarnações atrozes em busca da melhora.

Cansados de sucessivos e desastrosos recomeços, passaram a alimentar traumas e receios de retornar à escola da Terra e cometerem os mesmos desatinos. Foi então que o próprio Jesus, conjuntamente com a Divina Providência, intercedeu em favor de tais corações que lhe amavam o testemunho e a palavra, mas que não a honravam com a vivência, e recambiou suas almas atormentadas aos círculos benfazejos da Nova Revelação do Espiritismo. A princípio, ainda desencarnados, frequentaram as atividades socorristas da mediunidade na condição de sofredores e oponentes religiosos; posteriormente, de ânimo novo, acordando para novas perspectivas dos ensinos do Evangelho, adequados aos novos tempos, então se decidiram por reingressar na carne junto aos ambientes do Consolador como única medida aceitável para a grande maioria, face à rebeldia e ao montante das culpas que acrisolavam em sua intimidade.

Renascem padres, bispos, pastores, calvinistas, inquisidores, pítons e todos aqueles que algum dia na história experienciaram o contato com as Verdades evangélicas sem, contudo, fazerem-se "cartas vivas" da mensagem do Cristo. Renascem com esperanças novas e com visões ampliadas sobre suas responsabilidades.

Naturalmente que encurtei os dados com intuito de alerta e reflexão. Verificando minúcias do assunto, porém, é surpreendente e mesmo curioso a trajetória da grande maioria daqueles que hoje militam nas frentes espíritas. A partir disso passei à aquisição de respostas para antigas dúvidas sobre o modo de comportar dos espíritas, dilatando em muito meus sentimentos de compaixão para com todos e minha sensibilidade fraternal para com suas lutas pessoais.

Entendi que, mesmo sendo portadores do conhecimento e da fé, precisarão de mais tempo para permitirem uma renovação nesse perfil milenar. Os espíritas de "segunda vez" começam a renascer desde o último quartel do século XX, quando então, mais conscientes e tendo culpas milenares aliviadas pelos benemerentes serviços de caridade de seara espírita, começarão arregimentar condições propícias para uma viagem interior em busca de si mesmo e de sua própria elevação.

Constatei ainda nos registros, que o Brasil, celeiro eclético de crenças, tendo como fio condutor o Catolicismo, representa uma estrada com extrema riqueza de alternativas para esses corações temerosos e dispostos ao reinício.

Chamou-me ainda mais a atenção o trecho referente ao programa que fora delineado para atender essa demanda sócio-espiritual da humanidade. Consta nas notas que Bezerra de Menezes e um grande grupamento de servidores insculpiriam, com seu trabalho coletivo, as bases para o erguimento desse edifício de solidariedade e reencaminhamento.Segundo as conclusões de sábio psicólogos Celestes, o maior obstáculo íntimo, para almas com esse perfil, seria a indisposição ao contato comunitário, o que, então, os levou, sob o testemunho dos "médico dos pobres", a incitar o serviço da unificação como medida apropriada para que a lição da convivência em comunidade pudesse ser aprendida e desenvolvida, considerando outros compromissos maiores no futuro.

Analisando sob o prisma da imortalidade, a conclusão que cheguei é a de que está tudo certo, tudo ótimo, tudo sob controle, e somente a visão inibida, comum à maioria de nós quando na Terra, é que pode levar-nos a enfocar a comunidade espírita como local de loucuras e atraso. Não poderia ser diferente e embora necessite de muita melhora, particularmente, não guardo mais dúvidas sobre o valor do movimento espírita, do progresso efetuado por esses corações "semi-católicos" e, sobretudo, quanto à grandeza da Doutrina Espírita, que funciona como medicação atualizada para esse mister.

Passei a entender, sob enfoque mais ampliado, que a identidade de uma religião atende também a fatores de "sociologia espiritual", acima mesmo de meros fatos históricos da evolução das culturas humanas, levando-me a meditar em novos enfoques para a questão religiosa do Espiritismo. Enquanto os homens discutem, sem concluir, sobre a inconveniência ou mesmo o prejuízo do caráter religioso da Doutrina, o problema, em verdade, encontra-se no religiosismo abundante das almas que para ela foram e são atraídas.

Sem quaisquer generalizações sobre o tema, porque outros perfis completamente distintos de minha análise adentram aos ambientes fecundos das agremiações Kardecianas, não será demais afirmar que os espíritas, em maioria esmagadora, são os mesmos espíritos que ao longo desses vinte últimos séculos estiveram, mais ou menos, comprometidos ou identificados com a mensagem do Evangelho, deixando concluir facilmente que católicos, protestantes e alguns crentes ecléticos do Cristianismo compõem, quase sem exceções, o passado espiritual e o perfil moral daqueles que hoje assumem a designação de trabalhadores e dirigentes espíritas."

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Alma querida, 

as anotações de nosso irmão não deixam dúvidas.

Agora, quando indagares como pode um espírita agir em desacordo com seu conhecimento, guarde a lição de nosso missivista como pérola inesquecível.

Agindo com tolerância e compreensão acolherás pela sintonia o pensamento das almas nobres, que agem imparcialmente no bem de todos.

De posse de semelhante estado superior, terá contigo melhores possibilidades de cultivar o amor e o afeto por aqueles que ainda te causam desagrado ou mesmo a ofensa, na esfera de sua convivência doutrinária.

Qual de nós estará fora das bem elaboradas reflexões aqui descritas?

Exclusões, hipocrisias, institucionalismo, interpretações unívocas, personalismo, vaidade, controle hegemônico são perfis ainda vivos e influentes nos traços da conduta do espírita, e somente uma relação vigorosa de afabilidade e doçura será capaz de estabelecer um processo relacional útil, e que permita algum benefício na superação de tais óbices morais.

Amizade sincera, respeito incondicional, afeto, paz na convivência são os caminhos prováveis para a vitória.
Achaques e agastamentos, radicalismos e intolerância, ativismo recriminante são velhas e malfadadas medidas que tendem a açular as sombras e a inferioridade moral.

Dizes que não podes ser omisso, e concordamos. Entretanto, o ativismo do Cristão recomenda brandura, paciência e equilíbrio de ações. Mais que "tocar trombetas" ou exercer movimentos infrutíferos, a situação carece do serviço honroso e útil, fraterno e transformador pela força do exemplo.

Pensemos na estratégia de Jesus a seu tempo e conceberemos o modelo ideal da ação, ante os perfis evolutivos de cada ser, aprendendo, paulatinamente, o que seja viver comunitariamente.

O tempo ensinará que as alocuções desse irmão de ideal, referente às conclusões em seus estudos, reúne farto conteúdo que suscita muita indulgência e compaixão dos seareiros do Consolador, uns com os outros.

Não bastasse as assertivas lógicas e sensatas dessa alma querida, é bom que estejamos informados que esse coração generoso e bom não é somente um informante de passagem, pedindo um favor quando solicita remeter essas ideais ao plano físico. Ele foi sim um baluarte da autenticidade e um severo defensor da Verdade que ficou empanada em séculos de "falso cristianismo". Seu nome: Cairbar Schutel.