terça-feira, 8 de setembro de 2020

Vencendo o Personalismo

Livro: Mereça Ser Feliz
Autora Espiritual: Ermance Dufaux

Capítulo 32

Admirai, no entanto, a bondade de Deus, que nunca fecha a porta ao arrependimento. Vem um dia em que ao culpado, cansado de sofrer, com o orgulho afinal abatido, Deus abre os braços para receber o filho pródigo que se lhe lança aos pés. As provas rudes, ouvi-­me bem, são quase sempre indício de um fim de sofrimento e de um aperfeiçoamento do Espírito, quando aceitas com o pensamento em Deus.

O Evangelho Segundo o Espiritismo - Capítulo 14 - Item 9


Espíritos saindo primarismo para conquistas medianas, nossa principal qualidade é a disposição de mudança na melhoria íntima, já que nos arrependemos sinceramente do mal. Iniciamos, a exemplo do filho pródigo do Evangelho (1), a nossa viagem de volta à Casa Paterna buscando aconchego e a dulcificação do amor.

Essa volta, porém, exigir-nos-á o preço da reeducação, a começar pelo personalismo que se solidifica na intimidade como um dos pilares de nossas imperfeições.

Podemos entender o personalismo como sendo o apego com tudo que parte de nós. Esse apego é fator sinalizador de gratificação afetiva escassa conosco mesmo, insuficiência de auto-amor. Quando nos amamos verdadeiramente não há motivo para a atitude personalista, porque nos realizamos com o ato de ser sem aguardar compensação, aplauso e possessividade.

Seu traço mais comum é a paixão crônica com o eu manifestada de formas variadas, algumas delas são: irredutibilidade velada ou clara, vaidade intelectual, dificuldade de conviver pacificamente com a diversidade humana, manipulação interpretativa de conceitos, autoritarismo nas decisões, boicote na cooperação a projetos que partam de outras cabeças, agastamento ante as cobranças e correções, sistemática competição para produzir além dos outros e da capacidade pessoal, coleção de animosidades, excessiva valorização que conferimos a nós mesmos, "amor" próprio, apego às nossas obras, superlativa fixação dos valores que possuímos ou acreditamos possuir, pretensões de destaque e vício de ser elogiado.

Suas causas podem ser encontradas nas história remota da evolução, quando tivemos no instinto de conservação um importante fator de fixação e agregação de valores morais consolidando a consciência de si. A conservação como fonte de defesa e automatização da consciência de si tornou-se egoísmo, uma exageração dessa necessidade natural, na qual nos encontramos até hoje.

Na infância encontramos outras tantas razões muito bem abordadas por Sigmund Freud na questão da personalidade egocêntrica, cujo processo de amadurecimento psíquico é mal conduzido, ensejando carências afetivas profundas que irão refletir no homem adulto como insegurança e fantasias narcisistas.

Em torno de seus passos sempre se encontram a fama, o autoritarismo, a vaidade, o desejo de realce, a inveja: "súditos do império do eu".

Tendo subtraída a empatia, o personalista é alguém que não sabe dialogar, dividir, intercambiar. Não sabendo interagir com o outro, entender-lhe os motivos e necessidades, está sempre com uma "receita de viver" nos lábios, impedindo-se da mais nobre ação íntima da caridade que é o ato de compartilhar vivências com o ser alheio.

Como seu dinamismo é a centralização no "eu", a reeducação dessa tendência está em aprender a ouvir o outro. O ato de ouvir não se restringe a escutar palavras. Ouvir é o estado de plena receptividade para o outro, independentemente de quem seja.

Essa conquista será um exercício doloroso para o personalista. Exigirá desprendimento, humildade, assertividade, falar menos e meditar mais. Ouvir significa cultivar sensibilidade para com aqueles que nos rodeiam; sensibilidade que nos permita sempre um foco positivo do próximo entendendo-lhe as razões, ainda que esteja em equívoco, abrindo-se para ser-lhe útil, desarmado de pré-conceitos. Ouvir é aprender a receber críticas e admoestações até daqueles que nos parecem despreparados para fazê-las, habituando-se a indagar a real utilidade e importância das ideias pessoais. Ouvir é alteridade, respeito às singularidades de cada um. A partir daí se aprende a construir uma relação altruísta, pacífica e saudável com as diferenças e os diferentes, nas experiências de todo instante.

A vitória sobre o personalismo, portanto, está em sair de si acolhendo o outro diferente do eu com interesse altruísta e fraterno, aprendendo a "esvaziar-se do ego", sentindo o outro.

O retorno à Casa Paterna inclui o ato de desprender-se de si para ouvir o Pai. Tal lição será aprendida na escola da convivência diuturna com quantos passem pelos nossos caminhos.

Fazendo assim assumiremos definitivamente a condição de filhos pródigos em plenitude de sintonia com as riquezas de Deus, aprendendo a ouvir-Lhe os alvitres no foro da consciência, em favor da nossa felicidade.

1. Lucas 15:20


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